Esta parte de nossos registros é importante
no sentido de dar conhecimento aos músicos mais da atualidade sobre como eram
os equipamentos na época, as dificuldades em sua aquisição em Fortaleza e
outros detalhes curiosos.
No início do Conjunto Big Brasa adquirir
instrumentos ou acessórios musicais era muito difícil em Fortaleza. Não havia
nenhuma loja especializada neste setor. Algumas possuam seções com poucos
instrumentos ou acessórios e a diversificação dos produtos oferecidos era
mínima.
Por exemplo, quando se encontrava um tipo de
encordoamento ou mesmo simplesmente palhetas para guitarra em determinado lugar
você poderia se dar por satisfeito. Havia,
no entanto, a casa do Sr. Aurélio, no Benfica, onde podíamos encontrar peles
diversas para bateria (que eram de couro mesmo inicialmente e com o passar do
tempo foram substituídas pelas de nylon), palhetas para guitarra, também
difíceis de serem encontradas, baquetas e outros acessórios, como cordas para
guitarra e contrabaixo. Tudo isso somente podia ser encontrados na referida
loja. O “Seu Aurélio” era a salvação dos grupos musicais...
- O “embaixador” do Big Brasa em São Paulo
João Ribeiro da Silva Filho - o Tio João (in
memoriam), meu padrinho e amigo, sempre foi muito prestativo e por mim
considerado um verdadeiro embaixador do Big Brasa em São Paulo. Tenho que
registrar seus inestimáveis favores prestados a mim e por extensão ao Big
Brasa. Residindo em São Paulo, se tornou profundo conhecedor da cidade. Assim
sendo, todas as vezes que precisávamos de algum material desse tipo recorríamos
ao Tio João. Necessário destacar o seu interesse, a sua boa vontade em nos
ajudar, sua competência para fazer compras acertadamente e pela logística que
sempre empregava.
Com o Tio João nada tinha mistério e tudo
podia ser feito. Era o que se pode chamar de um cara desenrolado. Dependendo da
encomenda feita, se ele no conhecesse o equipamento ou o que fosse, dizia:
“Bem, eu não sei onde tem isso, mas pode deixar comigo que vou descobrir!” E
fazia mesmo. Pouco tempo depois ele dava retorno, dizendo que tinha pesquisado
sobre a encomenda, com todos os detalhes possíveis. Muito organizado, outra de
suas características era a capacidade com que embalava qualquer coisa (produto,
material ou equipamento) de forma que nada quebrasse. Um verdadeiro artista.
Uma vez ele conseguiu bater seu próprio
recorde de tempo, ao adquirir dois pedais de efeito tipo wah-wah e despachá-los
para Fortaleza por via aérea. O pedido foi feito em um dia e a encomenda chegou
no dia seguinte à noite. E nós fomos retirar a encomenda no setor de bagagens,
perto da meia-noite, ainda no antigo Aeroporto Pinto Martins. Diga-se que isso
foi na década de 60 início dos anos 70!
- Os
amplificadores e as caixas de som
As caixas
de som no início eram pequenas e integradas aos amplificadores. Tínhamos no
Conjunto Big Brasa amplificadores de 6, 8 e 10 watts, com as caixas de som, com
mais ou menos 70 a
80 centímetros
de altura, coisas simplesmente ridículas se comparadas ao que existe hoje em
dia em matéria de equipamentos musicais. Tanto que elas pouco aparecem nas
fotografias, escondidas atrás dos músicos. Imaginem: duas guitarras ligadas a
um amplificador de 6 watts, com um alto-falante de 6 ou 8 polegadas. Que som
forte! Com o passar do tempo houve um gradativo aumento da potência e da
qualidade dos equipamentos. Nos anos seguintes os amplificadores começaram a
ser produzidos em módulos, separadamente das caixas de som. Abaixo seguem
comentários sobre alguns desses equipamentos, para que vocês tenham uma ideia
mais precisa do material que nós usávamos.
Nota: aliás, em muitas apresentações da
atualidade parece que os tamanhos dos amplificadores retornaram, porém e
logicamente com uma qualidade melhor e potência muito maior. Hoje em dia as
bandas utilizam pequenos amplificadores nos palcos, que funcionam basicamente
para retornos de som para os músicos, mas todos eles com saídas de áudio em
linha de modo que se conectem diretamente às mesas de som e aos enormes
sistemas de amplificadores e caixas de som espalhados pelos grandes
eventos.
- O
amplificador Delta
Um dos
primeiros equipamentos utilizados pelo Big Brasa para o som de voz foi o
amplificador de marca Delta. Tinha o gabinete parecido com os rádios da mesma
marca (transmissores e receptores). Aquecia demais e precisava funcionar quase
sempre com a tampa aberta, para receber mais ventilação. Em uma das funções do
Big Brasa, o nosso Delta começou a apresentar defeito. Então o meu pai, cheio
de boa vontade, foi se meter a técnico e, inocentemente, meteu a mão dentro dele
para apertar uma válvula de saída de áudio, daquelas do tipo chupeta. Queimou a
ponta do dedo, logicamente! Além do susto, o choque também não deve ter sido
pequeno. E por brincadeira eu dizia, ainda vai, Mestre Alberto? E ele
respondia, sorrindo: “É, aquela foi de lascar!”, se referindo ao episódio.
O
superaquecimento dos amplificadores foi um problema difícil para o conjunto.
Eles ficavam mesmo que fogo e exatamente por isso apresentavam defeitos com
maior facilidade do que os atuais, queimando ou danificando os filamentos das
válvulas. Um dos macetes que descobrimos após algum tempo foi o de não
transportar os equipamentos logo após de desligá-los. Assim os bigus esperavam
um tempo suficiente para que as válvulas esfriassem e pudessem ser movimentadas
sem quebrar seus filamentos e queimar. Mais tarde, o papai apresentou uma ideia
muito legal para a solução do problema e que foi adotada imediatamente. Foi a
de comprar pequenos ventiladores, os quais, sobre uma chapa de sustentação
colocada embaixo dos amplificadores, passavam o tempo todo ligados, no deixando
o superaquecimento chegar. Os prejuízos decorrentes de equipamentos quebrados
por esse problema diminuíram depois desta simples, mas excelente ideia.
Após o
amplificador Delta surgiu mais um avanço: o serviço de som Giannini, modelo
A-100, também valvulado e composto por dois módulos, que ficavam montados em um
“rack”, com suas colunas de som e os seus respectivos suportes laterais. Na
parte de cima do rack ficava
instalado o misturador, para seis microfones, e na parte de baixo o
amplificador de potência. Naquela época era um dos melhores. Comparando-se ao
que existe hoje é como se estivéssemos utilizando uma mesa de som estéreo, com
tudo que tem direito e muita qualidade e potência de som. Cada aquisição de
equipamento causava intensa satisfação para todos, como esse serviço de som
A-100, comprado na loja Mesbla, que hoje no mais existe.
Num dos carnavais que tocamos em Cascavel
descobrimos que o som estava baixando (oscilando) muito por causa de uma
válvula que estava frouxa em seu suporte. Quente para caramba, mas o Marcílio
Mendonça (atualmente produtor e empresário do Studio ProAudio), que foi o
cantor daquela jornada momina. Ele de vez em quando ficava apertando a tal
válvula para que o som melhorasse. Quando comentamos o fato ele lembra e ri
muito até hoje. No ano seguinte surgiram outros modelos, o A-200 e o A-300, um
pouco melhores e mais potentes. Pouco a pouco, com o avanço tecnológico, novas
marcas e modelos de amplificadores apareceram no mercado. Fomos renovando nosso
equipamento, pouco a pouco.
- O
amplificador “Tremendão”
E mais uma novidade apareceu, com o excelente
amplificador “Tremendão”, da Gianinni, com boa qualidade e uma potência de 100
watts de saída, para guitarras, teclados, voz ou contrabaixo. Estes
amplificadores permaneceram bastante tempo no mercado e tinham uma saída
incrível. Todo conjunto musical desejava ter um amplificador Tremendão. Ele
tinha quatro válvulas de saída de áudio tipo 6L6, que produziam uma sonoridade
aveludada, um som mais puro. Para as caixas de contrabaixo podíamos utilizar válvulas
EL-34, que se encaixavam nos mesmos soquetes (encaixes para válvulas) mas que
tinham um som mais agressivo e duro, bem apropriado ao instrumento. Essas
máquinas resistiam bem rotina de ensaios
e funções variadas.
- O “Reverber”
Hoje em dia temos recursos modernos, mas os
sistemas de reverberação antigos tinham sonoridade inconfundível. Mais uma
novidade que os amplificadores Tremendão trouxeram foi o Reverber. Consistia em
um circuito ligado a um módulo, que ficava dentro do amplificador, numa caixa
metálica com duas molas e pequenas bobinas, as quais pelo circuito eletrônico produziam
a reverberação no som. O reverber enriquecia a qualidade de áudio nos solos e
também em marcações feitas pelas guitarras, ecoando suas notas e acordes.
Depois de acostumados ao reverber eu ficava
muito bem acostumado com sua sonoridade.
A reverberação produzida podia ser controlada através de botões específicos no
amplificador. Em compensação ele fazia muita falta quando apresentava algum
defeito. Quando um fiozinho desligava internamente, em especial no
compartimento metálico de molas e minúsculos transformadores, disparava uma
microfonia danada. E desse modo o reverber tinha que ser desligado
imediatamente, pois a microfonia se tornava insuportável (aquele apito bem
alto, chamado tecnicamente de “retroalimentação acústica”, que incomodava
bastante).
Não posso falar de reverber sem mencionar a
música “O Milionário”, que O Big Brasa tocou centenas de vezes nos bailes e
apresentações diversas. Esta música sem o recurso do reverber seria
impraticável de ser executada, por aqueles efeitos.
- O
amplificador True Reverber (Gianinni)
Usávamos esse amplificador para a guitarra-solo.
Tinha excelente qualidade, mas pouca potência sonora. Quando se aumentava o
volume mais um pouco o som ficava distorcido.
- A caixa
de som e amplificador Alex
Esse
amplificador possuía muita potência. Ele nos causou espanto pela primeira vez que
tivemos que abri-lo, para substituir um alto-falante que estava com problemas.
Tentamos abrir a caixa da forma convencional e não conseguimos visualizar os
alto-falantes! Depois de alguns minutos alguém notou uma abertura dentro da
caixa e ao olharmos para cima logo os encontramos, mas em posição não
convencional, ou seja, virados para baixo. A arquitetura sonora era diferente
das demais, que tinham os alto-falantes parafusados na parte frontal da caixa
de som.
Havia uma preocupação e a necessidade de trocar
de equipamentos com relativa frequência, em razão da concorrência dos demais
conjuntos. Por isso mesmo que a maioria
dos grupos não aguentava a barra e ia à falência... Por outro lado, para
economizar, fazíamos reformas nos equipamentos, como troca das coberturas de
napa, cantoneiras, pintura de suportes e outras. Cansei de passar noites quase
inteiras, horas a fio, retirando coberturas de napa dos amplificadores e das
caixas de som e recobrindo-os com novo material. Dava muito trabalho. Puxa
aqui, estira dali e pronto. Amplificadores e caixas novos de novo. Volta e meia
ficava um canto mal acabado mas tudo bem. No dava para ninguém notar e a
economia tinha sido feita... Desse modo o esforço estava plenamente
recompensado pelo prazer de nos apresentar com um instrumental novinho, bonito,
e com um som perfeito.
- Consertos
de emergência e as improvisações
Muitas vezes tínhamos que fazer consertos de
emergência nos amplificadores, na Capital ou no interior do Estado, quase
sempre com pouco ou nenhum material específico. Em uma festa que o Big Brasa
animou em Pacoti, um pouco antes de iniciar nós identificamos um defeito no
reverber. Levamos a caixa metálica para uma pequena oficina local e fizemos uma
solda em um fio da bobina de um reverber com um ferro de soldar enorme,
aquecido por uma forja! Vejam a sutileza dessa soldagem, em razão de não termos
levado um ferro de soldar convencional e de pequeno tamanho.
Em outra oportunidade o Carló desmontou um
amplificador de contrabaixo durante um baile, conseguiu localizar o defeito e
trocar um resistor (componente eletrônico), tendo o equipamento voltado a seu
funcionamento normal, com a substituto da peça, em uma rápida intervenção. Mas
a verdade que muitas vezes não
conseguimos resolver os problemas facilmente. Em algumas oportunidades os
amplificadores pifaram mesmo, para valer, e no teve jeito. Pela prática nós conhecíamos,
mais ou menos, quando o defeito era sério ou não. E também o bom senso para
decidir se daria ou no tempo para consertá-lo na hora, coisa muito difícil, por
inúmeras razões, falta de peças ou componentes eletrônicos ou de meios técnicos
apropriados, de material e de tempo para o reparo. Em virtude disso houve
períodos em que o Conjunto Big Brasa viajava com um amplificador de reserva,
para eventuais emergências.
- Os
cabos e as extensões, sempre problemáticos
Tenho que falar dos cabos! Cabos e mais cabos
coaxiais, para ligações dos diversos instrumentos (guitarras, contrabaixo,
microfones e teclados) aos amplificadores e as extensões elétricas. Não se podia
confiar muito neles, nem em seus “plugs” ou conectores. Mesmo quando não
apresentavam defeito durante as apresentações, quando alguém neles pisava, ou
simplesmente suas ligações se rompiam com nossos movimentos, no dia seguinte eu
ia examinar e testar um por um. Isto porque na hora de dobrá-los, ao fim dos
bailes poderia dar problema e alguma ligação se romper. Pegava logo o ferro de
soldar, solda, alicate de corte, sentava-me no chão ou em algum banquinho e
começava a revisão. Meu filho Alberto Neto, ainda criança, quase sempre ficava
perto de mim observando tudo e me ajudando nessas manutenções.
- A
famosa “mala-da-cobra”
Os músicos, os eletricistas e técnicos em
geral sabem o que vem a ser “mala-da-cobra”. Em geral, todo técnico que se
preza e também os conjuntos musicais têm este recurso. Chama-se de
mala-da-cobra toda caixa, bolsa ou qualquer outro tipo de depósito para
transportar os cabos, as extensões e outras miudezas necessárias ao
funcionamento do conjunto, tipo plugs diversos, conectores, tomadas, fita
isolante, parafusos extras e tudo aquilo que se imagina que poder quebrar numa
apresentação. A tal mala deveria conter ainda ferramentas de primeira
necessidade (um kit) para as emergências. Em nosso caso eu costumava levar na
mala-da-cobra também alguns componentes eletrônicos que costumeiramente
queimavam ou apresentavam defeitos, como alguns resistores, condensadores, além
logicamente de um bom ferro de soldar, alicate de corte, fita isolante e tudo
que nela coubesse.
Esse nome mala-da-cobra se justificou muito
bem quando, em uma ocasião, o conjunto tinha acabado de tocar em um clube de
Sobral e ao final da festa fomos guardar as tumbadoras em seus estojos de
proteção. Dentro deles foi encontrada uma cobra, desta vez de verdade! Que
susto. A cobra, certamente se encantou com o som do Big Brasa e com o calor dos
estojos. Felizmente saiu do esconderijo e ninguém ficou machucado.
- A
primeira bateria do Conjunto Big Brasa
Toda azul, com as partes metálicas de cor
cinza metálico, a primeira bateria que o Big Brasa usou foi adquirida da
charanga do Gumercindo, líder da torcida do Fortaleza Futebol Clube. Lembro
como se fosse hoje da alegria que todos sentimos depois que meu pai concretizou
o negócio. No primeiro mês de utilização ela sofreu uma pequena avaria. Quebrou
um suporte do bumbo.
Em razão da necessidade de uso nas festas
passou um tempo assim. Para vocês terem uma ideia, para que o bumbo se
sustentasse em firme era preciso colocar um transformador velho de lado para
servir de apoio... Assim mesmo velha, recebeu logo uma pintura nova e nos
prestou inestimáveis serviços. Possua excelente sonoridade e suas peles eram de
couro mesmo (tínhamos que saber como colocá-las nas armações). Ainda não havia
as facilidades das peles de nylon, modernas e facilmente substituíveis.
- A
bateria Pinguim
Em
madrepérola branca, de marca Pinguim, uma das melhores no momento, era de
excelente qualidade e muito bonita. Foi comprada em São Paulo. A minha mãe
Zisile negociava bordados de Fortaleza com minha Tia Zenóbia, que ainda residia
em São Paulo. Aproveitando uma das transferências que receberia por conta dos
negócios ela pediu ao tio João que fizesse a compra de uma bateria “novinha em
folha”.
Quando este instrumento chegou foi motivo de
admiração por todos nós. A bateria depois de montada ficou linda. O meu pai, na
preocupação de preservá-la em bom estado, mandou logo fazer uns estojos para
todos os seus apetrechos. Por essa excelente providência que essa bateria teve longa duração, sempre
bem conservada e em ordem.
- A
primeira distorção em Fortaleza!
Iniciativa,
curiosidade e vontade de fazer! Contarei para você como foi que surgiu a
primeira distorção do Big Brasa e de Fortaleza. Para que os mais novos tomem
conhecimento ocorreu uma verdadeira pesquisa, com pleno êxito. Naquela época não
existia o “Tio Google” para as consultas e nem o Youtube com a infinidade de
vídeos ensinando praticamente tudo! Tínhamos que fazer mesmo, simplesmente assim.
Foi assim que a ideia surgiu: ao ouvir umas
gravações, a fim de escolher músicas para nosso repertório, notava alguns sons
de guitarras super pesados, mas não sabia como é que os caras conseguiam aqueles
efeitos. Um tempo depois, ainda pensando no assunto, soube que existia um aparelho,
que conectado guitarra, produzia aquele som rachado e distorcido. Esse tal
aparelho se chamava de distorção. Fiquei louco de vontade de conseguir um som
daquele tipo e comecei a falar com todo mundo que eu achasse que poderia ter
uma ideia. Escrevi uma carta para o tio João e, depois que ele fez sua pesquisa
em São Paulo não conseguiu descobrir nada, para nossa tristeza. E continuei
procurando o tal aparelhinho (distorção) sem nada conseguir...
Na verdade eu nem sabia o nome do aparelho
direito, muito menos o Tio João, que leigo em música, não conhecia mesmo o som
que eu procurava. Pois olhem, segue a dica: quando desejarem alguma coisa,
finquem o pé e batalhem, lute e tome iniciativas que certamente serão bem
recompensados”.
Um belo dia, em minhas conversas com colegas,
disse para o Júlio Matos, um amigo nosso também aficionado por eletrônica, que
estava querendo comprar uma distorção mas não sabia onde. Para meu espanto ele
me falou que tinha uma revista de eletrônica com um esquema, ou seja, o diagrama
de montagem de uma distorção. Foi demais! O bom é que o Julinho gostava do
assunto e sempre foi um técnico muito competente e pesquisador. Assim ele ficou
interessadíssimo e disse que poderíamos tentar montar a tal distorção.
Compramos todos os componentes necessários
para a montagem e depois de poucos dias estava ele, com uma caixinha de metal,
que deveria ter sido de alguma outra montagem ou experiência anterior. Com
muito cuidado, localizamos quais os locais de entrada e de saída de som, para que
a guitarra fosse conectada ao aparelho e este ao amplificador. Fizemos os cabos
necessários, todas as devidas soldas, plugs e pronto. Preparamo-nos para o
resultado. Acreditem: neste momento mais parecíamos dois soldados tentando
desarmar uma mina, na expectativa de uma explosão, tal era nosso grau de
ansiedade. Suspense total. Após ligar tudo, peguei a guitarra e toquei algumas
notas. De início, nenhuma alteração e ficamos naquela, os dois meio sem jeito,
sem olhar um para o outro. Fui tocando mais um pouco e mexendo nos dois
potenciômetros (botões de regulagem) que o aparelhinho possuía. De repente, o
som ficou mais forte e pesado, começando a distorcer. Nessa hora, eu comecei a
rir muito e a dizer:
- “É
isso aí cara, este é o som que estava querendo, deu certo!” O Julinho estava
incrédulo, visto que ele próprio no sabia que som ou efeito sua montagem seria
capaz de produzir.
- Mais novidades com os pedais
“wah-wah”
O Conjunto Big Brasa sempre procurou criar um
diferencial e fazer inovações. Também foi o primeiro conjunto musical de
Fortaleza a usar o pedal conhecido como wah-wah, que fez um sucesso enorme em
nossas apresentações. Pouco tempo depois da distorção caseira por nós
construída o nosso pioneirismo continuou, desta vez com a aquisição de dois
pedais do tipo wah-wah, em Recife. Os equipamentos causaram admiração geral em
todos que ouviam o seu som, tanto que algumas pessoas ficavam, sem querer,
balançando a boca, imitando os sons “wah-wah” que minha guitarra produzia com
os tais pedais.
Inauguramos o wah-wah durante todo o Festival
Nordestino da Música Popular, realizado no Náutico Atlético Cearense, que teve
como vencedora a música Beira-Mar, do Ednardo, acompanhado pelo Big Brasa.
Ligado guitarra-solo produzia sons
diferentes e foi motivo de admiração. Algumas pessoas chegavam a ficar com a
boca fazendo o movimentação correspondente ao wah-wah.
Ao longo de minha carreira como
guitarrista-solo usei várias marcas de pedais desse tipo. Sua característica,
para quem é leigo ou não conhece esse pedal de efeito, é a de possibilitar a
que o músico alterne rapidamente de um som agudo para um grave e vice-versa,
através de movimentação com o pé, produzindo efeitos espetaculares. Daí o nome
desse pedal ser wah-wah.
-
Modificações na minha guitarra
Tive umas
quatro ou cinco guitarras durante a existência do Conjunto Big Brasa. Cuidava
muito bem delas, como tenho zelo por tudo que possuo até hoje. O músico que se
preza tem que tratar muito bem de seus instrumentos e acessórios musicais,
conservando-os sempre da melhor maneira possível. Uma dessas guitarras, a que
mais gostava foi uma Supersonic, fabricada pela Giannini, que passou a ter uma
sonoridade deferente. No princípio eu a usei por algum tempo sem modificação
nenhuma. Essa guitarra possua uma característica importante para um solista.
Com ela eu conseguia utilizar a alavanca diversas vezes sem que ela perdesse a
afinação (para quem músico fica mais
fácil entender). Nos improvisos em rocks e blues isso fundamental. Assim eu podia usar e abusar dos
efeitos com a alavanca, que a guitarra suportava muito bem, continuando
afinada.
Inspirado nas novidades, um dia resolvi
melhorar aquela guitarra, nas suas formas e em seu som. Vale lembrar novamente que
em Fortaleza não havia quase nada em termos de opções, nos Anos 60 e Jovem
Guarda. E se o músico quisesse inovações tinha que se virar por conta própria. Assim
parti para a ação e desmontei minha guitarra completamente. Inclusive seus
componentes eletrônicos, como os três captadores de som, sistema de alavanca,
molas, cavalete, braço, tudo. Ao final eu olhei para as peças e pensei: será
que vai dar certo? Com uma pequena serra “tico-tico”, limas e lixas, cortei um
pouco suas formas de modo que ela ficasse parecida com uma guitarra Fender, uma
das melhores do mundo. Depois começou a parte dos acabamentos. Apliquei massa
como se faz numa pintura de automóvel, no sentido de laqueá-la. A pintura de
branco foi aplicada com pistola, com um cuidado todo especial. Ficou muito
legal, parecendo até mesmo de fábrica.
Para a mudança da sonoridade instalei um novo
conjunto de captadores importados, que tinha adquirido durante uma de minhas
viagens à Zona Franca de Manaus. Escolhi um deles em substituição a um dos
originais, por ter uma sonoridade bem interessante. Detalhe: andei mexendo um
pouquinho nos pequenos circuitos dos controles de graves e agudos,
acrescentando ou modificando, na base da experimentação em alguns capacitores
(componentes eletrônicos que, dependendo de onde são usados, alteram o som). Enfim
encontrei uma sonoridade perfeita para meu uso. Passei então à fase crítica da
montagem de todos os componentes, para que ficasse afinando bem e conseguindo todas
as oitavas numa boa. Com um encordoamento zerado, não lembro a marca, comecei a
testar a nova guitarra. Deu tudo certo! Estava com uma verdadeira Fender de
fabricação caseira, que me serviu por muito tempo e que até hoje me traz ótimas
recordações. O sucesso nesta verdadeira operação foi pleno! A guitarra
Supersonic se transformou em uma guitarra importada, para os meus sentimentos,
possibilidades e gosto musical. E de tempos em tempos podia até levar um
polimento, tendo em vista que a tinta utilizada era propícia para isso. Ficava
sempre novinha e muito legal.
O som ficou muito parecido com a da guitarra
Fender. E sinceramente eu achava muito melhor, principalmente pelo fato de ter
dado certo e ter sido modificada por mim! Melhorava assim mais um diferencial
do Big Brasa.
- O
primeiro órgão eletrônico
A aquisição do primeiro órgão eletrônico, de
marca Diatron foi feita pelo meu pai, Alberto Ribeiro. Fomos juntos escolher o
equipamento e mais um melhoramento tinha sido conquistado pelo Conjunto. Com a
presença do órgão eletrônico o Big Brasa evoluiu muito, tendo em vista o
aumento das possibilidades de arranjos, combinação das sonoridades, marcação
rítmica e base harmônica mais completa, além dos próprios solos do instrumento.
Este Diatron não tinha muitos recursos, se comparado aos equipamentos modernos.
Possuía um vibrato e alguns timbres diferentes, com os controles de graves,
agudos e volume, este feito através de um pedal que volta e meia apresentava
defeito, quase sempre em seu cabo de ligação ao equipamento. O segundo órgão
adquirido pelo conjunto foi um Novatron, com algumas novidades, mas a mesma
essência do modelo anterior. Neste período tivemos também um teclado Minami,
adquirido em São Paulo, de qualidade muito boa.
Falando ainda de teclados que o Big Brasa
usou, inovamos bastante. Quando passei a tocar teclados eu logo adquiri três
pedais (sustainner, phaser e flanger), os quais interligados ao órgão produziam
sons bem diferentes dos usuais, despertando muita atenção por seus efeitos
sonoros. E olhe que os sons produzidos eram na essência muito diferentes e
assemelhados a teclados e sintetizadores bem recentes...
- A
utilização de sintetizadores, com seus múltiplos recursos
Além de órgãos eletrônicos utilizei diversos
outros teclados, a exemplo de um sintetizador monofônico (para os que no
leigos, que tocava uma nota de cada vez, no produzindo acordes). Pouco tempo
depois fui a São Paulo e adquiri um sintetizador polifônico, mais moderno. Com
ele a parte harmônica funcionava bem, visto que os acordes soavam normalmente e
com excelente qualidade. Entretanto a dificuldade para programar os diferentes
sons e efeitos era grande. Perdia-se muito tempo e tínhamos que ser mais
operador do que músico, na realidade. Não satisfeito com esse equipamento,
troquei-o em Fortaleza por um órgão eletrônico de dois teclados e comprei outro
sintetizador, o Poly-800. Com eles passamos a ter sons com timbres muito
bonitos e efeitos incríveis.
Começava a fase que perdura até os dias
atuais, na qual um músico não pode ser apenas instrumentista. Tem que ao mesmo
tempo ter habilidade suficiente para operar os equipamentos, programá-los etc. Daí
por diante chegaram os sintetizadores mais pesados, tipo DX-7, da Yamaha.
O primeiro modelo DX7 era excelente, em seus
diversos aspectos. Com sua qualidade de som espetacular, o equipamento pesava
aproximadamente oito quilos e possua um teclado de cinco oitavas, muito macio.
Possibilitava ao músico nele programar, ou seja, criar seus próprios sons e
timbres à vontade e armazená-los em sua memória. O DX7 vinha equipado com um
cartucho que continha uma infinidade de sons programados, além daqueles
previamente gravados de fábrica. Adquiri depois outros cartuchos RAM, aqueles
nos quais podíamos gravar e assim programar sons, timbres e combinações de sons
prediletos para poder utilizá-los em outro DX7, se necessário.
Mais tarde tive um teclado Roland, modelo
E-20, de excelente qualidade. Com esse instrumento eu e o Airton França (ex-pistonista
do Big Brasa) formamos uma dupla interessante. Ele com um violão de marca
Ovation, de sonoridade ótima e cantava (muito bem, por sinal). Em alguns
arranjos até mesmo tocava piston e eu fazendo alguma parte de vocalização e
tocava órgão e sintetizador.
Na fase dos órgãos eletrônicos modernos,
cheguei a utilizar alguns desses teclados que fazem tudo, com bateria, baixo,
harmonia e efeitos para solo de diversos tipos. Chamados também de
desempregadores de músicos, visto que um tecladista com um desses equipamentos
pode substituir um conjunto inteiro, dependendo do ambiente que esteja
trabalhando. Associado a esses órgãos eletrônicos cada vez mais perfeitos, mantive
por muito tempo um sintetizador DX7 - II, da Yamaha, que possibilitava centenas
de possibilidades de programação, enfim, um instrumento utilizado pelos
melhores grupos no mundo inteiro e com
ele utilizava um teclado Roland, também de sonoridade excelente.