terça-feira, 22 de agosto de 2017

EQUIPAMENTOS E AS DIFICULDADES DA ÉPOCA



Esta parte de nossos registros é importante no sentido de dar conhecimento aos músicos mais da atualidade sobre como eram os equipamentos na época, as dificuldades em sua aquisição em Fortaleza e outros detalhes curiosos. 

No início do Conjunto Big Brasa adquirir instrumentos ou acessórios musicais era muito difícil em Fortaleza. Não havia nenhuma loja especializada neste setor. Algumas possuam seções com poucos instrumentos ou acessórios e a diversificação dos produtos oferecidos era mínima.

Por exemplo, quando se encontrava um tipo de encordoamento ou mesmo simplesmente palhetas para guitarra em determinado lugar você poderia se dar por  satisfeito. Havia, no entanto, a casa do Sr. Aurélio, no Benfica, onde podíamos encontrar peles diversas para bateria (que eram de couro mesmo inicialmente e com o passar do tempo foram substituídas pelas de nylon), palhetas para guitarra, também difíceis de serem encontradas, baquetas e outros acessórios, como cordas para guitarra e contrabaixo. Tudo isso somente podia ser encontrados na referida loja. O “Seu Aurélio” era a salvação dos grupos musicais...

- O “embaixador” do Big Brasa em São Paulo

João Ribeiro da Silva Filho - o Tio João (in memoriam), meu padrinho e amigo, sempre foi muito prestativo e por mim considerado um verdadeiro embaixador do Big Brasa em São Paulo. Tenho que registrar seus inestimáveis favores prestados a mim e por extensão ao Big Brasa. Residindo em São Paulo, se tornou profundo conhecedor da cidade. Assim sendo, todas as vezes que precisávamos de algum material desse tipo recorríamos ao Tio João. Necessário destacar o seu interesse, a sua boa vontade em nos ajudar, sua competência para fazer compras acertadamente e pela logística que sempre empregava. 

Com o Tio João nada tinha mistério e tudo podia ser feito. Era o que se pode chamar de um cara desenrolado. Dependendo da encomenda feita, se ele no conhecesse o equipamento ou o que fosse, dizia: “Bem, eu não sei onde tem isso, mas pode deixar comigo que vou descobrir!” E fazia mesmo. Pouco tempo depois ele dava retorno, dizendo que tinha pesquisado sobre a encomenda, com todos os detalhes possíveis. Muito organizado, outra de suas características era a capacidade com que embalava qualquer coisa (produto, material ou equipamento) de forma que nada quebrasse. Um verdadeiro artista.

Uma vez ele conseguiu bater seu próprio recorde de tempo, ao adquirir dois pedais de efeito tipo wah-wah e despachá-los para Fortaleza por via aérea. O pedido foi feito em um dia e a encomenda chegou no dia seguinte à noite. E nós fomos retirar a encomenda no setor de bagagens, perto da meia-noite, ainda no antigo Aeroporto Pinto Martins. Diga-se que isso foi na década de 60 início dos anos 70!

- Os amplificadores e as caixas de som

As caixas de som no início eram pequenas e integradas aos amplificadores. Tínhamos no Conjunto Big Brasa amplificadores de 6, 8 e 10 watts, com as caixas de som, com mais ou menos 70 a 80 centímetros de altura, coisas simplesmente ridículas se comparadas ao que existe hoje em dia em matéria de equipamentos musicais. Tanto que elas pouco aparecem nas fotografias, escondidas atrás dos músicos. Imaginem: duas guitarras ligadas a um amplificador de 6 watts, com um alto-falante de 6 ou 8 polegadas. Que som forte! Com o passar do tempo houve um gradativo aumento da potência e da qualidade dos equipamentos. Nos anos seguintes os amplificadores começaram a ser produzidos em módulos, separadamente das caixas de som. Abaixo seguem comentários sobre alguns desses equipamentos, para que vocês tenham uma ideia mais precisa do material que nós usávamos.

Nota: aliás, em muitas apresentações da atualidade parece que os tamanhos dos amplificadores retornaram, porém e logicamente com uma qualidade melhor e potência muito maior. Hoje em dia as bandas utilizam pequenos amplificadores nos palcos, que funcionam basicamente para retornos de som para os músicos, mas todos eles com saídas de áudio em linha de modo que se conectem diretamente às mesas de som e aos enormes sistemas de amplificadores e caixas de som espalhados pelos grandes eventos. 


- O amplificador Delta

Um dos primeiros equipamentos utilizados pelo Big Brasa para o som de voz foi o amplificador de marca Delta. Tinha o gabinete parecido com os rádios da mesma marca (transmissores e receptores). Aquecia demais e precisava funcionar quase sempre com a tampa aberta, para receber mais ventilação. Em uma das funções do Big Brasa, o nosso Delta começou a apresentar defeito. Então o meu pai, cheio de boa vontade, foi se meter a técnico e, inocentemente, meteu a mão dentro dele para apertar uma válvula de saída de áudio, daquelas do tipo chupeta. Queimou a ponta do dedo, logicamente! Além do susto, o choque também não deve ter sido pequeno. E por brincadeira eu dizia, ainda vai, Mestre Alberto? E ele respondia, sorrindo: “É, aquela foi de lascar!”, se referindo ao episódio.

O superaquecimento dos amplificadores foi um problema difícil para o conjunto. Eles ficavam mesmo que fogo e exatamente por isso apresentavam defeitos com maior facilidade do que os atuais, queimando ou danificando os filamentos das válvulas. Um dos macetes que descobrimos após algum tempo foi o de não transportar os equipamentos logo após de desligá-los. Assim os bigus esperavam um tempo suficiente para que as válvulas esfriassem e pudessem ser movimentadas sem quebrar seus filamentos e queimar. Mais tarde, o papai apresentou uma ideia muito legal para a solução do problema e que foi adotada imediatamente. Foi a de comprar pequenos ventiladores, os quais, sobre uma chapa de sustentação colocada embaixo dos amplificadores, passavam o tempo todo ligados, no deixando o superaquecimento chegar. Os prejuízos decorrentes de equipamentos quebrados por esse problema diminuíram depois desta simples, mas excelente ideia.

Após o amplificador Delta surgiu mais um avanço: o serviço de som Giannini, modelo A-100, também valvulado e composto por dois módulos, que ficavam montados em um “rack”, com suas colunas de som e os seus respectivos suportes laterais. Na parte de cima do rack ficava instalado o misturador, para seis microfones, e na parte de baixo o amplificador de potência. Naquela época era um dos melhores. Comparando-se ao que existe hoje é como se estivéssemos utilizando uma mesa de som estéreo, com tudo que tem direito e muita qualidade e potência de som. Cada aquisição de equipamento causava intensa satisfação para todos, como esse serviço de som A-100, comprado na loja Mesbla, que hoje no mais existe.

Num dos carnavais que tocamos em Cascavel descobrimos que o som estava baixando (oscilando) muito por causa de uma válvula que estava frouxa em seu suporte. Quente para caramba, mas o Marcílio Mendonça (atualmente produtor e empresário do Studio ProAudio), que foi o cantor daquela jornada momina. Ele de vez em quando ficava apertando a tal válvula para que o som melhorasse. Quando comentamos o fato ele lembra e ri muito até hoje. No ano seguinte surgiram outros modelos, o A-200 e o A-300, um pouco melhores e mais potentes. Pouco a pouco, com o avanço tecnológico, novas marcas e modelos de amplificadores apareceram no mercado. Fomos renovando nosso equipamento, pouco a pouco.

- O amplificador “Tremendão”

E mais uma novidade apareceu, com o excelente amplificador “Tremendão”, da Gianinni, com boa qualidade e uma potência de 100 watts de saída, para guitarras, teclados, voz ou contrabaixo. Estes amplificadores permaneceram bastante tempo no mercado e tinham uma saída incrível. Todo conjunto musical desejava ter um amplificador Tremendão. Ele tinha quatro válvulas de saída de áudio tipo 6L6, que produziam uma sonoridade aveludada, um som mais puro. Para as caixas de contrabaixo podíamos utilizar válvulas EL-34, que se encaixavam nos mesmos soquetes (encaixes para válvulas) mas que tinham um som mais agressivo e duro, bem apropriado ao instrumento. Essas máquinas resistiam bem  rotina de ensaios e funções variadas.

- O “Reverber”

Hoje em dia temos recursos modernos, mas os sistemas de reverberação antigos tinham sonoridade inconfundível. Mais uma novidade que os amplificadores Tremendão trouxeram foi o Reverber. Consistia em um circuito ligado a um módulo, que ficava dentro do amplificador, numa caixa metálica com duas molas e pequenas bobinas, as quais pelo circuito eletrônico produziam a reverberação no som. O reverber enriquecia a qualidade de áudio nos solos e também em marcações feitas pelas guitarras, ecoando suas notas e acordes. 

Depois de acostumados ao reverber eu ficava muito bem acostumado com sua  sonoridade. A reverberação produzida podia ser controlada através de botões específicos no amplificador. Em compensação ele fazia muita falta quando apresentava algum defeito. Quando um fiozinho desligava internamente, em especial no compartimento metálico de molas e minúsculos transformadores, disparava uma microfonia danada. E desse modo o reverber tinha que ser desligado imediatamente, pois a microfonia se tornava insuportável (aquele apito bem alto, chamado tecnicamente de “retroalimentação acústica”, que incomodava bastante).
Não posso falar de reverber sem mencionar a música “O Milionário”, que O Big Brasa tocou centenas de vezes nos bailes e apresentações diversas. Esta música sem o recurso do reverber seria impraticável de ser executada, por aqueles efeitos.   
  
- O amplificador True Reverber (Gianinni)

Usávamos esse amplificador para a guitarra-solo. Tinha excelente qualidade, mas pouca potência sonora. Quando se aumentava o volume mais um pouco o som ficava distorcido.

- A caixa de som e amplificador Alex

Esse amplificador possuía muita potência. Ele nos causou espanto pela primeira vez que tivemos que abri-lo, para substituir um alto-falante que estava com problemas. Tentamos abrir a caixa da forma convencional e não conseguimos visualizar os alto-falantes! Depois de alguns minutos alguém notou uma abertura dentro da caixa e ao olharmos para cima logo os encontramos, mas em posição não convencional, ou seja, virados para baixo. A arquitetura sonora era diferente das demais, que tinham os alto-falantes parafusados na parte frontal da caixa de som.

Havia uma preocupação e a necessidade de trocar de equipamentos com relativa frequência, em razão da concorrência dos demais conjuntos. Por isso mesmo  que a maioria dos grupos não aguentava a barra e ia à falência... Por outro lado, para economizar, fazíamos reformas nos equipamentos, como troca das coberturas de napa, cantoneiras, pintura de suportes e outras. Cansei de passar noites quase inteiras, horas a fio, retirando coberturas de napa dos amplificadores e das caixas de som e recobrindo-os com novo material. Dava muito trabalho. Puxa aqui, estira dali e pronto. Amplificadores e caixas novos de novo. Volta e meia ficava um canto mal acabado mas tudo bem. No dava para ninguém notar e a economia tinha sido feita... Desse modo o esforço estava plenamente recompensado pelo prazer de nos apresentar com um instrumental novinho, bonito, e com um som perfeito.

- Consertos de emergência e as improvisações

Muitas vezes tínhamos que fazer consertos de emergência nos amplificadores, na Capital ou no interior do Estado, quase sempre com pouco ou nenhum material específico. Em uma festa que o Big Brasa animou em Pacoti, um pouco antes de iniciar nós identificamos um defeito no reverber. Levamos a caixa metálica para uma pequena oficina local e fizemos uma solda em um fio da bobina de um reverber com um ferro de soldar enorme, aquecido por uma forja! Vejam a sutileza dessa soldagem, em razão de não termos levado um ferro de soldar convencional e de pequeno tamanho.

Em outra oportunidade o Carló desmontou um amplificador de contrabaixo durante um baile, conseguiu localizar o defeito e trocar um resistor (componente eletrônico), tendo o equipamento voltado a seu funcionamento normal, com a substituto da peça, em uma rápida intervenção. Mas a verdade  que muitas vezes não conseguimos resolver os problemas facilmente. Em algumas oportunidades os amplificadores pifaram mesmo, para valer, e no teve jeito. Pela prática nós conhecíamos, mais ou menos, quando o defeito era sério ou não. E também o bom senso para decidir se daria ou no tempo para consertá-lo na hora, coisa muito difícil, por inúmeras razões, falta de peças ou componentes eletrônicos ou de meios técnicos apropriados, de material e de tempo para o reparo. Em virtude disso houve períodos em que o Conjunto Big Brasa viajava com um amplificador de reserva, para eventuais emergências.

- Os cabos e as extensões, sempre problemáticos

Tenho que falar dos cabos! Cabos e mais cabos coaxiais, para ligações dos diversos instrumentos (guitarras, contrabaixo, microfones e teclados) aos amplificadores e as extensões elétricas. Não se podia confiar muito neles, nem em seus “plugs” ou conectores. Mesmo quando não apresentavam defeito durante as apresentações, quando alguém neles pisava, ou simplesmente suas ligações se rompiam com nossos movimentos, no dia seguinte eu ia examinar e testar um por um. Isto porque na hora de dobrá-los, ao fim dos bailes poderia dar problema e alguma ligação se romper. Pegava logo o ferro de soldar, solda, alicate de corte, sentava-me no chão ou em algum banquinho e começava a revisão. Meu filho Alberto Neto, ainda criança, quase sempre ficava perto de mim observando tudo e me ajudando nessas manutenções.

- A famosa “mala-da-cobra”

Os músicos, os eletricistas e técnicos em geral sabem o que vem a ser “mala-da-cobra”. Em geral, todo técnico que se preza e também os conjuntos musicais têm este recurso. Chama-se de mala-da-cobra toda caixa, bolsa ou qualquer outro tipo de depósito para transportar os cabos, as extensões e outras miudezas necessárias ao funcionamento do conjunto, tipo plugs diversos, conectores, tomadas, fita isolante, parafusos extras e tudo aquilo que se imagina que poder quebrar numa apresentação. A tal mala deveria conter ainda ferramentas de primeira necessidade (um kit) para as emergências. Em nosso caso eu costumava levar na mala-da-cobra também alguns componentes eletrônicos que costumeiramente queimavam ou apresentavam defeitos, como alguns resistores, condensadores, além logicamente de um bom ferro de soldar, alicate de corte, fita isolante e tudo que nela coubesse.

Esse nome mala-da-cobra se justificou muito bem quando, em uma ocasião, o conjunto tinha acabado de tocar em um clube de Sobral e ao final da festa fomos guardar as tumbadoras em seus estojos de proteção. Dentro deles foi encontrada uma cobra, desta vez de verdade! Que susto. A cobra, certamente se encantou com o som do Big Brasa e com o calor dos estojos. Felizmente saiu do esconderijo e ninguém ficou machucado. 

- A primeira bateria do Conjunto Big Brasa

Toda azul, com as partes metálicas de cor cinza metálico, a primeira bateria que o Big Brasa usou foi adquirida da charanga do Gumercindo, líder da torcida do Fortaleza Futebol Clube. Lembro como se fosse hoje da alegria que todos sentimos depois que meu pai concretizou o negócio. No primeiro mês de utilização ela sofreu uma pequena avaria. Quebrou um suporte do bumbo.

Em razão da necessidade de uso nas festas passou um tempo assim. Para vocês terem uma ideia, para que o bumbo se sustentasse em firme era preciso colocar um transformador velho de lado para servir de apoio... Assim mesmo velha, recebeu logo uma pintura nova e nos prestou inestimáveis serviços. Possua excelente sonoridade e suas peles eram de couro mesmo (tínhamos que saber como colocá-las nas armações). Ainda não havia as facilidades das peles de nylon, modernas e facilmente substituíveis.  

- A bateria Pinguim

Em madrepérola branca, de marca Pinguim, uma das melhores no momento, era de excelente qualidade e muito bonita. Foi comprada em São Paulo. A minha mãe Zisile negociava bordados de Fortaleza com minha Tia Zenóbia, que ainda residia em São Paulo. Aproveitando uma das transferências que receberia por conta dos negócios ela pediu ao tio João que fizesse a compra de uma bateria “novinha em folha”.

Quando este instrumento chegou foi motivo de admiração por todos nós. A bateria depois de montada ficou linda. O meu pai, na preocupação de preservá-la em bom estado, mandou logo fazer uns estojos para todos os seus apetrechos. Por essa excelente providência  que essa bateria teve longa duração, sempre bem conservada e em ordem.

- A primeira distorção em Fortaleza!

Iniciativa, curiosidade e vontade de fazer! Contarei para você como foi que surgiu a primeira distorção do Big Brasa e de Fortaleza. Para que os mais novos tomem conhecimento ocorreu uma verdadeira pesquisa, com pleno êxito. Naquela época não existia o “Tio Google” para as consultas e nem o Youtube com a infinidade de vídeos ensinando praticamente tudo! Tínhamos que fazer mesmo, simplesmente assim. 

Foi assim que a ideia surgiu: ao ouvir umas gravações, a fim de escolher músicas para nosso repertório, notava alguns sons de guitarras super pesados, mas não sabia como é que os caras conseguiam aqueles efeitos. Um tempo depois, ainda pensando no assunto, soube que existia um aparelho, que conectado guitarra, produzia aquele som rachado e distorcido. Esse tal aparelho se chamava de distorção. Fiquei louco de vontade de conseguir um som daquele tipo e comecei a falar com todo mundo que eu achasse que poderia ter uma ideia. Escrevi uma carta para o tio João e, depois que ele fez sua pesquisa em São Paulo não conseguiu descobrir nada, para nossa tristeza. E continuei procurando o tal aparelhinho (distorção) sem nada conseguir...

Na verdade eu nem sabia o nome do aparelho direito, muito menos o Tio João, que leigo em música, não conhecia mesmo o som que eu procurava. Pois olhem, segue a dica: quando desejarem alguma coisa, finquem o pé e batalhem, lute e tome iniciativas que certamente serão bem recompensados”.

Um belo dia, em minhas conversas com colegas, disse para o Júlio Matos, um amigo nosso também aficionado por eletrônica, que estava querendo comprar uma distorção mas não sabia onde. Para meu espanto ele me falou que tinha uma revista de eletrônica com um esquema, ou seja, o diagrama de montagem de uma distorção. Foi demais! O bom é que o Julinho gostava do assunto e sempre foi um técnico muito competente e pesquisador. Assim ele ficou interessadíssimo e disse que poderíamos tentar montar a tal distorção.

Compramos todos os componentes necessários para a montagem e depois de poucos dias estava ele, com uma caixinha de metal, que deveria ter sido de alguma outra montagem ou experiência anterior. Com muito cuidado, localizamos quais os locais de entrada e de saída de som, para que a guitarra fosse conectada ao aparelho e este ao amplificador. Fizemos os cabos necessários, todas as devidas soldas, plugs e pronto. Preparamo-nos para o resultado. Acreditem: neste momento mais parecíamos dois soldados tentando desarmar uma mina, na expectativa de uma explosão, tal era nosso grau de ansiedade. Suspense total. Após ligar tudo, peguei a guitarra e toquei algumas notas. De início, nenhuma alteração e ficamos naquela, os dois meio sem jeito, sem olhar um para o outro. Fui tocando mais um pouco e mexendo nos dois potenciômetros (botões de regulagem) que o aparelhinho possuía. De repente, o som ficou mais forte e pesado, começando a distorcer. Nessa hora, eu comecei a rir muito e a dizer:

-  “É isso aí cara, este é o som que estava querendo, deu certo!” O Julinho estava incrédulo, visto que ele próprio no sabia que som ou efeito sua montagem seria capaz de produzir.

- Mais novidades com os pedais “wah-wah”

O Conjunto Big Brasa sempre procurou criar um diferencial e fazer inovações. Também foi o primeiro conjunto musical de Fortaleza a usar o pedal conhecido como wah-wah, que fez um sucesso enorme em nossas apresentações. Pouco tempo depois da distorção caseira por nós construída o nosso pioneirismo continuou, desta vez com a aquisição de dois pedais do tipo wah-wah, em Recife. Os equipamentos causaram admiração geral em todos que ouviam o seu som, tanto que algumas pessoas ficavam, sem querer, balançando a boca, imitando os sons “wah-wah” que minha guitarra produzia com os tais pedais.

Inauguramos o wah-wah durante todo o Festival Nordestino da Música Popular, realizado no Náutico Atlético Cearense, que teve como vencedora a música Beira-Mar, do Ednardo, acompanhado pelo Big Brasa. Ligado  guitarra-solo produzia sons diferentes e foi motivo de admiração. Algumas pessoas chegavam a ficar com a boca fazendo o movimentação correspondente ao wah-wah.

Ao longo de minha carreira como guitarrista-solo usei várias marcas de pedais desse tipo. Sua característica, para quem é leigo ou não conhece esse pedal de efeito, é a de possibilitar a que o músico alterne rapidamente de um som agudo para um grave e vice-versa, através de movimentação com o pé, produzindo efeitos espetaculares. Daí o nome desse pedal ser wah-wah.

- Modificações na minha guitarra

Tive umas quatro ou cinco guitarras durante a existência do Conjunto Big Brasa. Cuidava muito bem delas, como tenho zelo por tudo que possuo até hoje. O músico que se preza tem que tratar muito bem de seus instrumentos e acessórios musicais, conservando-os sempre da melhor maneira possível. Uma dessas guitarras, a que mais gostava foi uma Supersonic, fabricada pela Giannini, que passou a ter uma sonoridade deferente. No princípio eu a usei por algum tempo sem modificação nenhuma. Essa guitarra possua uma característica importante para um solista. Com ela eu conseguia utilizar a alavanca diversas vezes sem que ela perdesse a afinação (para quem  músico fica mais fácil entender). Nos improvisos em rocks e blues isso  fundamental. Assim eu podia usar e abusar dos efeitos com a alavanca, que a guitarra suportava muito bem, continuando afinada.

Inspirado nas novidades, um dia resolvi melhorar aquela guitarra, nas suas formas e em seu som. Vale lembrar novamente que em Fortaleza não havia quase nada em termos de opções, nos Anos 60 e Jovem Guarda. E se o músico quisesse inovações tinha que se virar por conta própria. Assim parti para a ação e desmontei minha guitarra completamente. Inclusive seus componentes eletrônicos, como os três captadores de som, sistema de alavanca, molas, cavalete, braço, tudo. Ao final eu olhei para as peças e pensei: será que vai dar certo? Com uma pequena serra “tico-tico”, limas e lixas, cortei um pouco suas formas de modo que ela ficasse parecida com uma guitarra Fender, uma das melhores do mundo. Depois começou a parte dos acabamentos. Apliquei massa como se faz numa pintura de automóvel, no sentido de laqueá-la. A pintura de branco foi aplicada com pistola, com um cuidado todo especial. Ficou muito legal, parecendo até mesmo de fábrica.

Para a mudança da sonoridade instalei um novo conjunto de captadores importados, que tinha adquirido durante uma de minhas viagens à Zona Franca de Manaus. Escolhi um deles em substituição a um dos originais, por ter uma sonoridade bem interessante. Detalhe: andei mexendo um pouquinho nos pequenos circuitos dos controles de graves e agudos, acrescentando ou modificando, na base da experimentação em alguns capacitores (componentes eletrônicos que, dependendo de onde são usados, alteram o som). Enfim encontrei uma sonoridade perfeita para meu uso. Passei então à fase crítica da montagem de todos os componentes, para que ficasse afinando bem e conseguindo todas as oitavas numa boa. Com um encordoamento zerado, não lembro a marca, comecei a testar a nova guitarra. Deu tudo certo! Estava com uma verdadeira Fender de fabricação caseira, que me serviu por muito tempo e que até hoje me traz ótimas recordações. O sucesso nesta verdadeira operação foi pleno! A guitarra Supersonic se transformou em uma guitarra importada, para os meus sentimentos, possibilidades e gosto musical. E de tempos em tempos podia até levar um polimento, tendo em vista que a tinta utilizada era propícia para isso. Ficava sempre novinha e muito legal.

O som ficou muito parecido com a da guitarra Fender. E sinceramente eu achava muito melhor, principalmente pelo fato de ter dado certo e ter sido modificada por mim! Melhorava assim mais um diferencial do Big Brasa.   

- O primeiro órgão eletrônico

A aquisição do primeiro órgão eletrônico, de marca Diatron foi feita pelo meu pai, Alberto Ribeiro. Fomos juntos escolher o equipamento e mais um melhoramento tinha sido conquistado pelo Conjunto. Com a presença do órgão eletrônico o Big Brasa evoluiu muito, tendo em vista o aumento das possibilidades de arranjos, combinação das sonoridades, marcação rítmica e base harmônica mais completa, além dos próprios solos do instrumento. Este Diatron não tinha muitos recursos, se comparado aos equipamentos modernos. Possuía um vibrato e alguns timbres diferentes, com os controles de graves, agudos e volume, este feito através de um pedal que volta e meia apresentava defeito, quase sempre em seu cabo de ligação ao equipamento. O segundo órgão adquirido pelo conjunto foi um Novatron, com algumas novidades, mas a mesma essência do modelo anterior. Neste período tivemos também um teclado Minami, adquirido em São Paulo, de qualidade muito boa.  

Falando ainda de teclados que o Big Brasa usou, inovamos bastante. Quando passei a tocar teclados eu logo adquiri três pedais (sustainner, phaser e flanger), os quais interligados ao órgão produziam sons bem diferentes dos usuais, despertando muita atenção por seus efeitos sonoros. E olhe que os sons produzidos eram na essência muito diferentes e assemelhados a teclados e sintetizadores bem recentes...

- A utilização de sintetizadores, com seus múltiplos recursos

Além de órgãos eletrônicos utilizei diversos outros teclados, a exemplo de um sintetizador monofônico (para os que no leigos, que tocava uma nota de cada vez, no produzindo acordes). Pouco tempo depois fui a São Paulo e adquiri um sintetizador polifônico, mais moderno. Com ele a parte harmônica funcionava bem, visto que os acordes soavam normalmente e com excelente qualidade. Entretanto a dificuldade para programar os diferentes sons e efeitos era grande. Perdia-se muito tempo e tínhamos que ser mais operador do que músico, na realidade. Não satisfeito com esse equipamento, troquei-o em Fortaleza por um órgão eletrônico de dois teclados e comprei outro sintetizador, o Poly-800. Com eles passamos a ter sons com timbres muito bonitos e efeitos incríveis.

Começava a fase que perdura até os dias atuais, na qual um músico não pode ser apenas instrumentista. Tem que ao mesmo tempo ter habilidade suficiente para operar os equipamentos, programá-los etc. Daí por diante chegaram os sintetizadores mais pesados, tipo DX-7, da Yamaha.

O primeiro modelo DX7 era excelente, em seus diversos aspectos. Com sua qualidade de som espetacular, o equipamento pesava aproximadamente oito quilos e possua um teclado de cinco oitavas, muito macio. Possibilitava ao músico nele programar, ou seja, criar seus próprios sons e timbres à vontade e armazená-los em sua memória. O DX7 vinha equipado com um cartucho que continha uma infinidade de sons programados, além daqueles previamente gravados de fábrica. Adquiri depois outros cartuchos RAM, aqueles nos quais podíamos gravar e assim programar sons, timbres e combinações de sons prediletos para poder utilizá-los em outro DX7, se necessário.

Mais tarde tive um teclado Roland, modelo E-20, de excelente qualidade. Com esse instrumento eu e o Airton França (ex-pistonista do Big Brasa) formamos uma dupla interessante. Ele com um violão de marca Ovation, de sonoridade ótima e cantava (muito bem, por sinal). Em alguns arranjos até mesmo tocava piston e eu fazendo alguma parte de vocalização e tocava órgão e sintetizador.


Na fase dos órgãos eletrônicos modernos, cheguei a utilizar alguns desses teclados que fazem tudo, com bateria, baixo, harmonia e efeitos para solo de diversos tipos. Chamados também de desempregadores de músicos, visto que um tecladista com um desses equipamentos pode substituir um conjunto inteiro, dependendo do ambiente que esteja trabalhando. Associado a esses órgãos eletrônicos cada vez mais perfeitos, mantive por muito tempo um sintetizador DX7 - II, da Yamaha, que possibilitava centenas de possibilidades de programação, enfim, um instrumento utilizado pelos melhores grupos no mundo inteiro e  com ele utilizava um teclado Roland, também de sonoridade excelente.

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