quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O Big Brasa e Minha Vida Musical


O Big Brasa e Minha Vida Musical

INTRODUÇÃO
 
A música esteve sempre em minha vida, marcando forte presença. Desde criança, em São Paulo, e depois em Fortaleza, o mundo da música influenciou minha maneira de ser e despertou algumas características e habilidades que talvez não aflorassem sem ele.

As palavras seguintes foram escritas com o simples objetivo de registrar para os meus filhos - e quem sabe netos - e outros parentes, além de amigos e colegas, o que aconteceu durante o meu envolvimento com a música, as minhas diversas e estreitas ligações com o meio musical, particularmente no período em que existiu o conjunto musical Big Brasa, do qual fiz parte primeiramente como guitarrista-solo e depois como tecladista, administrando-o por alguns anos.

Agora com a Internet as chances de estes conhecimentos passarem adiante serão maiores e fico feliz se puder de alguma forma contribuir para aqueles que começam a carreira artística ou para os amigos saudosistas, que como eu consideram esse período como verdadeiramente inesquecível.

Os fatos passam muito depressa e muitos acontecimentos simplesmente desaparecem de nossa memória ou talvez fiquem armazenados em longínquos arquivos perdidos no emaranhado de nossa mente. Sempre pensei em escrever sobre o meu envolvimento com a música. Ao aprender que existe uma diferença bem grande entre a fantasia, os sonhos e a realidade, decidi pôr em prática e detonar o projeto. De início gostaria de afirmar que este pequeno ensaio não tem grandes pretensões no que se refere à escrita. As idéias serão sempre mais importantes do que as regras, quando se trata da transmissão de fatos. Portanto, aqueles que se interessarem pelos conhecimentos aqui contidos, procurem desfrutar o máximo possível e entender todos os acontecimentos estabelecendo parâmetros existentes aos anos em que eles ocorreram, ou seja, com as dificuldades do momento, o ímpeto da juventude, a falta de experiência em decorrência da idade.

Não espere uma obra literária, mas sim um relato simples de um cara esforçado e que começou a trabalhar muito cedo. Na cronologia, procurarei entremear os fatos que para mim foram mais significativos, de modo especial aqueles ligados à música. Você, que agora está iniciando a leitura desta história, deverá estar com o espírito numa boa, desarmado de qualquer preconceito. Não fique triste e não desanime se não for músico e por esse motivo deixar de entender algum detalhe técnico, em especial sobre equipamentos ou eletrônica. Calma, fique frio, que ainda há tempo para aprender muita coisa interessante...

Nós, que participamos do conjunto musical Big Brasa, vivemos um período extraordinário, pois conseguimos realizar um de nossos primeiros sonhos, transformando-os em uma realidade palpável, conhecida e apreciada por muitas pessoas. A existência do Big Brasa, entre outros fatores benéficos, contribuiu ainda para que eu ganhasse mais desembaraço, por força dos inúmeros contatos realizados, o que particularmente me auxiliou muito, pois aprendi a enfrentar os problemas desde cedo e a tentar resolvê-los, na medida do possível. Algumas decepções decorrentes do trabalho nunca nos desanimaram. As inúmeras vitórias e o sucesso obtidos muito enriqueceram nossas vidas, tenho certeza.

Independentemente do caminho seguido pelos participantes do conjunto Big Brasa ou das pessoas que estavam à nossa volta, tudo o que passamos fortaleceu nossos espíritos, personalidades e massageou nossos egos, o que não faz mal a ninguém. A vivência adquirida, os perigos enfrentados, as descobertas feitas, as experiências, os obstáculos superados, tudo isso nos fez muito bem.  Não há uma rigorosa ordem cronológica dos fatos narrados. Do conjunto musical Big Brasa temos imagens apenas em fotografias. Entretanto, no decorrer da leitura você encontrará vários flashes referentes à música, ao Big Brasa ou a seus integrantes, os quais, de acordo com o envolvimento de cada participante nos episódios relatados, de maneira direta ou indireta, remeterão avisos para as áreas mais remotas de nossa memória e certamente trarão lembranças agradáveis.

Foram muitas as experiências e situações vividas durante nossa jornada, muitos desafios e perigos enfrentados. Todos começamos a trabalhar ainda muito jovens, com muito entusiasmo e dedicação pelo que fazíamos. Certamente que as circunstâncias diversas nos trouxeram mais responsabilidade e equilíbrio. É por demais oportuno agradecer a Deus e a nossos guias por nos terem protegido dos perigos que nos rondaram.

Agradecimento especial todos devemos a meu pai, Alberto Ribeiro da Silva, o Mestre Alberto, e à minha mãe, Francisca Amasile Pereira da Silva, a Dona Zisile, pela ajuda constante, incondicional e das mais diversas formas, no desenvolvimento do conjunto. De modo particular agradeço à minha mulher Aliete, que muito me incentivou, me compreendeu e suportou as dificuldades decorrentes da profissão, visto que ainda jovens não tivemos quase oportunidade de diversão. Os sábados, domingos e feriados não existiam para nós para lazer, era puro trabalho, muitas vezes cansativo, mas gratificante. Quem é músico sabe disso muito bem...

O COMEÇO DE TUDO

-  Música desde criança

Meu nome é João Ribeiro da Silva Neto. Nasci em São José dos Campos, São Paulo. Filho de pais maranhenses, Alberto Ribeiro da Silva e Francisca Amasile Pereira da Silva. Em São José, morava na Rua Justino Cobra, 235, na Vila Ema. A cidade, de clima frio, sempre foi muito agradável, limpa e calma. Tenho excelentes lembranças de minha infância.

Alguns costumes do sul são muito diferentes dos nordestinos. Quase sempre brincava sozinho, por falta de colegas. Talvez para preencher esses espaços, minha mãe se desdobrava para me dar presentes sempre que podia. Não só brinquedos, mas principalmente livros, muitos livros. A coleção completa de Monteiro Lobato, os “Contos de Grimm”, “Contos de Andersen”, “Antes que Aprendam na Rua” e a coleção “Tesouro da Juventude”, foram meus bons companheiros. Com quase seis anos de idade comecei a estudar acordeon. Minha professora era D. Ivone, e morava a poucos quarteirões de nossa casa, na Vila Ema. Lembro-me na realidade de que ela tocava as músicas para eu ouvir e depois me ensinava a melodia. Nesse tempo eu não tinha ainda acordeon. Ficava a seu lado direito e usava somente o teclado de um acordeon de 80 baixos, da D. Ivone, de marca Scandalli. Aprendi a utilizar os baixos, que fazem a marcação e a harmonia. Depois de alguns meses ganhei de presente meu primeiro acordeon, de 14 baixos. Esse acordeon, também Scandalli, foi adquirido de um judeu, amigo do meu pai, chamado Luís Rosemberg, mediante uma troca na qual entrou até uma coleção Tesouro da Juventude, quando eu tinha 6 para 7 anos de idade.

Quando voltava da aula, a pé, vinha tocando “Rosa Maria”, que segundo meus pais era a música que eu gostava mais, talvez por tê-la aprendido primeiro. O segundo acordeon, aos 8 anos, foi presente de minha mãe Zisile, também Scandalli, mas de 80 baixos, tão grande para mim que eu não podia segurá-lo de forma correta. O incentivo e gosto de meus pais pela música foram constantes. Até o bolo de meu aniversário de 6 anos, muito grande e confeitado por minha mãe, tinha a forma de uma cítara. Na foto ao lado apareço no terraço de nossa casa, em São José dos Campos.

-      Tentativa de conseguir um milagre com música

Da infância e dos primeiros anos de música, lembro de um fato interessante, coisas de menino. Certo dia, meu pai chegou  em casa trazendo um presente para mim. Cinco ou seis pintinhos, que ele ganhou não sei onde. Fiquei super animado com os bichinhos e, para curtir melhor ainda aqueles “brinquedos” coloquei-os para nadar em um tanque no quintal. Devo ter ficado ali por algum tempo me divertindo e olhando os pintinhos nadarem. Não sei porque motivo saí de perto, me envolvi com outra coisa, certamente, e esqueci aquela brincadeira. Foi o suficiente para a tragédia. Quando eu lembrei dos pintinhos e voltei correndo para continuar a brincadeira me deparei com todos eles flutuando no tanque. Morreram de cansaço pois, pela altura do tanque e quantidade de água, não conseguiram alcançar a borda e sair.  A ligação desse lance com a música deu-se pelo fato de eu ter pegado o acordeon e ir para a frente de um oratório e ficar tocando desesperadamente para Nossa Senhora e pedindo que ela ressuscitasse os pintinhos. Mas infelizmente isso não ocorreu. Achava que com a música iria agradar Nossa Senhora e assim facilitar aquele meu difícil pedido.

Já em Fortaleza, por volta de 1962, quando morava perto da Igreja de Fátima, voltei a estudar acordeon com o professor João Colares, hoje maestro. Ensinava em sua própria casa, na rua Joaquim Távora, centro da cidade. Estudava uma temporada e parava outra, não por malandragem, mas por dificuldades de transporte e problemas de saúde. Quando voltava tinha que repetir o primeiro livro de novo. Não avancei o esperado, creio. Mas serviu para que eu aprimorasse o conhecimento de leitura musical.

Em 1963 ocorreu nossa mudança para Messejana, um pequeno e maravilhoso distrito a oito quilômetros de Fortaleza, de clima saudável, o que veio a constituir um marco importante em nossas vidas. Nos trouxe muita sorte e felicidade, principalmente pelo meu pai ter realizado um de seus sonhos, o de comprar uma casa própria em Fortaleza. Em princípio voltei-me para a gandaia. Muitos colegas para brincar, jogar bola e malandrar. Tudo o que faltava em São José dos Campos apareceu de repente. Aí eu passei uma boa temporada, mais ou menos um ano, sem querer saber de música. Dava um trabalho danado para a mamãe e só queria jogar futebol de salão, de campo, tudo. Fui campeão de Futebol de Salão pelo Colégio Cearense em 1965, jogando como goleiro e também como atacante. Mas em compensação fui reprovado no final do ano em cinco matérias. É como aquela velha história: para jogar, um aço, para estudar, um fracasso... 

Com 14 anos fui contaminado outra vez pela música. Depois das brincadeiras de dublagens, quis aprender a tocar violão. Logo consegui adquirir um, de tamanho médio, mas não sabia nem mesmo afiná-lo. Descobri que  em nossa rua, a José Hipólito, morava o Zé da Senhora, que era um jogador de futebol do Salgado da Gama, time de Messejana, que sabia tocar violão e me ensinou a afinar e a tocar os primeiros acordes. Uma de suas músicas prediletas era a Marcha dos Marinheiros. Nas primeiras semanas eu devo ter perturbado muito o Zé da Senhora, porque quase todas as tardes passava na casa dele para que conferisse a afinação do instrumento e tocasse alguma música. Daí voltava para casa e tentava repetir tudo até aprender.

Perto do campo de futebol do Salgado da Gama, em Messejana, moravam dois irmãos, que também tocavam a Marcha dos Marinheiros e outras músicas muito bem. No violão, faziam batidas de bolero e muitas outras que eu não conhecia, as que hoje em dia o pessoal acha super brega. Não se negavam a ensinar o que sabiam. Por isso freqüentei diversas vezes a casa desses rapazes e aprendi muito com eles, aos quais deixo registrado o meu agradecimento.

Naquela época os meios para o aprendizado musical em Fortaleza, particularmente em Messejana, praticamente não existiam, nada se comparando aos que existem hoje em dia, com revistas de músicas cifradas para violão, fitas de aula em vídeo e métodos para aprendizagem de todo o tipo. Naquele tempo a gente tinha que aproveitar todas as chances possíveis para aprender.

- A época das dublagens
 
Em Messejana, entre os anos de 1964 e 1965, antes mesmo da idéia ou pretensão de formar um conjunto musical, eu e alguns de meus colegas de infância nos reuníamos em nossa casa, na garagem, para fazer dublagens. No grupo estavam sempre o José Wellington, o Luís, o Amaury, o Sérgio e outros meninos e meninas mais novos, que faziam parte da platéia. Nós colocávamos uns discos na radiola – quase sempre compactos do Elvis Presley - e começavam as dublagens. Tinha aplausos no final e tudo, como em um show de verdade. Foram realmente bons tempos.
-      As serenatas em Messejana

Mais tarde, na adolescência, após termos aprendido um pouco de violão e usado os conhecimentos de teclado do acordeon para tocar escaleta, fizemos muitas serenatas em Messejana. A escolha do repertório e o ensaio das músicas sempre foi o de mais importante.

As serenatas eram feitas com toda a tranqüilidade, pois diferentemente de hoje em dia, praticamente não havia perigo nas ruas e podíamos transitar até às altas horas da madrugada e voltar para casa sem problemas. O roteiro das serenatas passava pelas casas das paqueras, namoradas ou simplesmente de colegas. Na maioria das vezes tocávamos na casa de quase todas as garotas de nossa turma.

Após o ensaio e a definição do repertório a turma toda se deslocava pelas ruas conversando animadamente. Quando nos aproximávamos de uma das casas escolhidas para a serenata havia o momento silencioso da chegada, nem sempre tão silencioso como deveria ser, e um certo temor de que o pai da garota acordasse e reclamasse. Depois, o início das músicas e a espera do sinal, que consistia no acendimento de uma lâmpada qualquer da casa, de preferência externa, para que notássemos que a serenata tinha sido percebida. Tudo nos deixava muito ansiosos. Parecia existir uma certa magia naquilo que fazíamos.

Em uma das serenatas feitas na casa do Hugo Pompeu, que fica no lado oeste da lagoa de Messejana, quando estávamos tocando e cantando aquela música que diz assim: - Vento que balança as palhas do coqueiro... Um amigo nosso, chamado Luciano, se pendurou nas palhas de um coqueiro anão para fazer uma real sonoplastia. Resultado: no meio da música a palha quebrou e ele caiu no chão, fazendo um barulho danado. A cena marcou o fim da serenata e o começo da “farra”. Daí por diante o riso generalizou-se e a serenata não teve condições de prosseguir. Fomos embora depressa, antes que houvesse alguma reclamação por parte dos donos da casa.

No início desse período de serenatas, quando a maioria da turma tinha 15 anos, havia pureza total no que se refere às bebidas e quaisquer outros envolvimentos perigosos para a nossa idade. Drogas, nem pensar. Só mais tarde é que um ou outro fazia “uma base”, como se chamava, tomando um pouco de cerveja, mas sem nenhum exagero. Eu nunca gostei de bebidas e por isso mesmo ficava sem beber nada. Tenho certeza de que fiz bem.

Tempos depois, profissionalmente no Big Brasa, nunca tomava nada de bebidas alcoólicas. Este exemplo procurei transmitir para meus filhos, no sentido de que, na minha opinião, o músico que se preza tem que estar sempre sóbrio para melhor desempenhar sua função. Graças a Deus nunca precisei de bebida alcoólica ou de nenhum outro tipo de estimulante para tocar. Em funções no Big Brasa como guitarrista-solo, especialmente nos temas onde havia muitos improvisos, sentia muitas vezes uma sensação espetacular, indescritível, quando a própria música me elevava o espírito de forma que eu não conseguia ver ninguém naqueles momentos, parecendo estar em um mundo inteiramente novo e espetacular. Ou seja, a própria música me embriagava. Isso ocorria por vezes também em razão do ambiente em que nos apresentávamos, visto que alguns nos favoreciam com iluminação adequada, “luz negra” ou outros efeitos especiais de palco que ajudavam a “fazer o clima”. Em muitas oportunidades, completamente envolvido pela música, cheguei a fazer improvisações na guitarra, das quais no dia seguinte não conseguia lembrar quase nada.

- Como surgiu o apelido "Beiró"
 
Muita gente não sabe como surgiu o apelido “Beiró”, através do qual fiquei conhecido no meio musical. Foi assim: em Messejana, de 13 para 14 anos eu gostava demais de jogar bola. Fizemos um campinho de futebol num terreno em frente à nossa casa e, depois que chegava do Colégio Cearense, corria para lá e passava a tarde inteira no “racha”. A mamãe, quando tinha que me chamar, à distância, gritava  “João Ribeiroooooo”, estendendo a terminação da palavra, de modo que o que se ouvia a distância era apenas o “beiroooooo”. E assim,  por brincadeira, um vizinho nosso, o Pinha, começou a me chamar somente de “Beiró”, como soava o chamamento de minha mãe. Daí o apelido pegou e fiquei conhecido assim. Na foto ao lado estou posando como goleiro na rua José Hipólito, a “Estrada do Fio” de antigamente (1964).

Se no meio musical sou conhecido por Beiró, como radioamador, classe “A”, de prefixo PT7-JSN, meu nome (ou QRA) é Silva Neto, por soar mais facilmente. “QRA” significa o nome do operador, segundo o código internacional “Q”, utilizado em transmissões via rádio. Em Brasília e no serviço público federal, no qual servi por muitos anos como Analista de Informações, ligado aos órgãos de Inteligência do Ministério do Trabalho e da Presidência da República, me chamavam de Silva Neto. No seio da família simplesmente de João Ribeiro. É este o nome que realmente gosto de ser chamado. Pudera eu ter conhecido meu avô João Ribeiro da Silva, homem bom, que desapareceu cedo, mas conseguiu deixar lembranças fortíssimas em toda a família, as quais perduram até hoje. 


João Ribeiro da Silva Neto

Nota: a seguir, trechos do livro "O Big Brasa e Minha Vida Musical", sobre a trajetória do Conjunto Musical Big Brasa e a minha própria, como músico. (1999)

Vejam todas as matérias e vídeos publicados no Portal Messejana


Vídeos relacionados do Big Brasa:

http://www.portalmessejana.com.br/g_bigbrasa.php

A idéia de formação do Big Brasa


A idéia de formação do Big Brasa



- O “Quartel General”, em Messejana
 
A idéia de formar um conjunto surgiu em conversa com os colegas de Messejana. A partir daí, com o total apoio de meus pais, foi como uma bola de neve. A vontade e o entusiasmo pela música cresceram rapidamente. A cada dia novas pesquisas, conversas com os amigos e a vontade de formação de um grupo musical ia aumentando progressivamente. Era só o que falávamos na época. O sonho tinha começado para mim.

O embrião do conjunto musical Big Brasa foi em nossa casa, na Rua José Hipólito, 698, em Messejana. Durante toda a existência do grupo e de minha vida musical a sede sempre foi a mesma. O local onde foi realizado o primeiro ensaio do grupo foi por algum tempo meu quarto, que dividia com o Carló. Tinha as paredes todas pintadas, com desenhos coloridos, feitos com tinta a óleo. Nele desenhávamos de tudo. Guitarras, pistas de corrida e até mesmo o famoso personagem “Amigo da Onça”, este feito pelo Carló. Até um dia desses, em uma das reformas que fiz em nossa casa, vimos as marcas das pinturas que ainda estão lá, agora encobertas por um tipo de revestimento. Aquele ambiente era nosso mundo. O violão sempre ficava disponível, em cima de uma cama ou cadeira, para facilitar o seu rápido acesso. Tudo o que era de equipamento nós montávamos empilhados, de modo a formar uma “parede de som”. Sem intenção, nós projetávamos o que iria acontecer em um futuro breve.


João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

A presença marcante do “Mestre Alberto”


A presença marcante do “Mestre Alberto”



Alberto Ribeiro da Silva, meu pai. O Mestre Alberto, como alguns o chamam até hoje, teve presença marcante no Big Brasa.
 
Apreciador fanático da boa música, independente do estilo, mesmo sem conhecimentos teóricos sobre o assunto sempre demonstrou ter bom ouvido, pois como ele próprio diz, sabia quando “alguma coisa estava errada”. Acompanhou o Big Brasa por uns três anos. Nas festas ele ficava circulando, ouvindo o som do conjunto dos diferentes pontos do clube para nos informar se estava bom ou não. Volta e meia trazia elogios recebidos ou reclamações (quase sempre de diretores ou dos coroas) sobre o alto volume de som do grupo. Cuidava dos contratos e de receber e distribuir os cachês para o grupo, na base de 10 por cento do líquido para cada participante. Exerceu fundamental papel, também, como orientador do conjunto, uma espécie de guru. 

Apesar de ser um ardoroso apreciador da música, ele sempre nos alertava para o fato de que o conjunto poderia “não dar camisa a ninguém”, querendo dizer que deveríamos estudar e ter outra profissão, tendo em vista as dificuldades que os músicos encontram, via de regra, para sobreviver apenas da música, de modo especial numa região pobre como a Nordeste.  

João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

Os equipamentos e as dificuldades da época


Os equipamentos e as dificuldades da época

  
-      As primeiras guitarras

Nossas primeiras guitarras foram adquiridas do conjunto “Os Rataplans”, dos meus amigos César Barreto e seu irmão Antônio Carlos Barreto Filho, o Barretinho, que infelizmente nos deixou há algum tempo. Eles tocavam com guitarras de fabricação caseira. Instrumentos bem construídos, leves, e que deveríamos ter mantido até hoje como verdadeiras relíquias musicais. Como “Os Rataplans” estava em vias de renovar seu instrumental, adquirimos dele duas guitarras e um contrabaixo.

Com esses instrumentos fizemos nossa grande estréia, no Balneário Clube de Messejana, e na minha primeira guitarra por muitas vezes toquei o prefixo do Big Brasa, “And I Love Her”, dos Beatles. A renovação de nosso equipamento transcorreu de forma gradual e contínua, nos anos seguintes, de acordo com nossas possibilidades financeiras e com o progressivo aumento do número de contratos.

Sobre essa pequena guitarra vale mencionar que poucos dias antes de nossa primeira apresentação o César Barreto esteve em nossa casa e me ensinou a introdução da música “O Tijolinho”, na tonalidade de Lá Maior. Eu ficava simplesmente fascinado com o som que ele conseguia “tirar” e pela facilidade que tocava a guitarra, parecia brincadeira. Para o César aquilo era a coisa mais simples do mundo, porque tinha prática e estava bem acostumado com o instrumento. Olhando para ele, eu pensava: “puxa, será que vou conseguir tocar desse jeito algum dia?”. O César  e todos os seus companheiros de conjunto, o Barretinho (guitarra e vocal), o Camelo (baterista) e o Adilson (contrabaixista) sempre deram a maior força para nós.

-      O uso do contrabaixo

Para aqueles que são leigos ou não têm muita percepção musical, a falta de um contrabaixo em um conjunto é mais ou menos como a falta de um goleiro em um time de futebol, para ser  “sutil”  na comparação. Ou a mesma coisa que sentir-se inteiramente nu, em plena Praça do Ferreira, no meio de uma multidão. O negócio é “brabo”. Quando a gente está tocando uma música, e o contrabaixo, por algum motivo, pára de funcionar ou deixa de tocar algumas notas, sente-se um vácuo, um vazio, uma sensação estranhíssima. Quando ele volta é uma beleza, o sangue retorna, a música fica mais harmoniosa, enfim, tudo vai bem. O contrabaixista tem que ser um cara ligado. Não pode faltar nem por poucos instantes.

No início dos chamados Anos Dourados, nós do Big Brasa, em Fortaleza, particularmente pela falta de equipamentos e informações musicais diversas, tocávamos sem contrabaixo. Acostumados que estávamos a cantar com o acompanhamento de violão ou violões, a substituição pelas guitarras foi aceita com todo o entusiasmo e não se notava muito a falta de um contrabaixo pelo próprio desconhecimento de sua necessidade, conforme foi dito.

Ainda bem que foi por pouco tempo. Depois que se acostuma pelo menos por uma vez a tocar com a marcação e com a harmonia proporcionadas pelo contrabaixo não se consegue mais retornar à situação anterior.

A entrada do contrabaixo no Big Brasa foi  incentivada  pelo “quase irmão” e grande amigo, o saudoso Barretinho, irmão do César Barreto. Excelente músico, saxofonista, guitarrista e vocalista dos “Rataplans”. Ele insistiu com o meu pai, dizendo que o contrabaixo era a alma de um conjunto e que não se podia tocar sem ele. Daí para a frente a coisa mudou - e para bem melhor! 

Vale dizer que nas próprias gravações iniciais dos anos 60, o contrabaixo não era destacado como merece. Ouvia-se seu som e sua marcação, mas os destaques e maior presença do instrumento nos arranjos musicais veio mais tarde. Hoje a gente percebe que as músicas que caracterizaram a Jovem Guarda, gravadas na época do iê-iê-iê, (música “pop”, como também era designada na época), por exemplo, têm aquele sonzinho de lata, meio “fajuto”, se comparado à qualidade que se possui na atualidade.

-      Instrumentos e acessórios musicais

No início do Big Brasa tudo era muito difícil em Fortaleza. Não havia nenhuma loja especializada em instrumentos musicais. Algumas possuíam seções com poucos instrumentos ou acessórios. A diversificação dos produtos oferecidos era mínima. Por exemplo, quando se encontrava um tipo de encordoamento ou mesmo simplesmente “palhetas” para violão em determinado lugar você já poderia se dar por satisfeito.

Havia, no entanto, a casa do Sr. Aurélio (avô do saxofonista Zezinho), no Benfica, onde podíamos encontrar peles diversas para bateria, palhetas para guitarra (isso mesmo!) palheta era coisa difícil para caramba. Também baquetas e outros acessórios, como cordas para guitarra e contrabaixo. Esses acessórios somente podiam ser encontrados lá. Hoje em dia a casa ainda vende esses materiais, dirigida pelas sobrinhas e outros familiares do Sr. Aurélio, já falecido. Esse senhor, nós descobrimos que nasceu parece que em Riachão, mesma terra de minha mãe. Um dia desses, recentemente, estive por lá para comprar um encordoamento de nylon, à noite. Uma das senhoras me reconheceu prontamente. Muita memória, depois de aproximadamente 25 anos. Mas disse que estava um pouco mudado, mais gordo etc. Imagine ela... Mas é assim mesmo, quando se passa bastante tempo sem ver alguém, imaginamos que a pessoa permanece tal como está armazenada em nossa memória, com os traços intactos. Mas o tempo vai nos pregando surpresas.

Em outra oportunidade encontrei, em uma feira de informática, com um guitarrista, chamado Evaldo, que tocava em um conjunto do Bairro de Fátima. Ao me ver, ele disse, muito admirado:

- Puxa, cara, você não mudou nada, não tem nenhum cabelo branco, o que é que você tem feito?

O Evaldo é apenas um pouco mais velho do que eu  e já estava com a cabeça toda branca. Um dos segredos, acho eu, é aprender a encarar com tranqüilidade a ação do tempo e sempre avaliar cada situação de acordo com nosso potencial do momento.

-      Os amplificadores e as caixas de som

As caixas de som, como chamávamos, no início eram pequenas e integradas aos amplificadores. Tínhamos no Big Brasa amplificadores de 6, 8 e 10 Watts, com as caixas de som, com mais ou menos 70 a 80 centímetros de altura, coisas simplesmente ridículas se comparadas ao que existe hoje em dia em matéria de equipamentos musicais. Tanto que pouco aparecem nas fotografias, escondidas atrás dos músicos. Imaginem só: duas guitarras ligadas a um amplificador de 6 Watts, com um alto-falante de 6 ou 8 polegadas. Que sonzão!

Com o aumento da potência e da qualidade dos equipamentos, nos anos seguintes os amplificadores começaram a ser produzidos em módulos, separadamente das caixas de som. Abaixo seguem-se comentários sobre alguns desses equipamentos, para que vocês tenham uma idéia mais precisa do material que nós trabalhamos.

-      O amplificador Delta
 
Um dos primeiros equipamentos utilizados pelo Big Brasa para o som de voz  foi o amplificador Delta. Tinha o gabinete parecido com os rádios  transmissores e receptores da mesma marca. Aquecia demais e precisava funcionar com a tampa aberta, para receber mais ventilação. Em uma das funções do Big Brasa, o “bicho” estava dando problema. O papai, cheio de boa vontade, foi se meter a técnico e, inocentemente, meteu a mão dentro do Delta para apertar uma válvula de saída de áudio, daquelas tipo chupeta. Queimou a ponta do dedo, logicamente. Além do susto, o choque também não deve ter sido pequeno. Ainda vai, Mestre Alberto?

O superaquecimento dos amplificadores foi um problema seríssimo para o conjunto. Eles ficavam “mesmo que fogo” e exatamente por isso apresentavam defeito com maior facilidade do que os atuais, queimando ou danificando filamentos de válvulas. Um dos macetes que descobrimos foi o de não transportar o equipamento logo após de desligá-los. Os bigus esperavam um pouco, tempo suficiente para que as válvulas esfriassem e pudessem ser movimentadas sem pifar. Mais tarde, o papai apresentou uma idéia muito legal para a solução do problema, imediatamente adotada. Foi a de comprar pequenos ventiladores, os quais, sobre uma chapa de sustentação colocada embaixo dos amplificadores, passavam o tempo todos ligados, não deixando o superaquecimento chegar. Os prejuízos decorrentes de equipamentos quebrados por esse problema diminuíram depois desta simples, mas excelente idéia.

Após esse amplificador Delta, surgiu mais um avanço: o serviço de som Gianinni, modelo A-100, valvulado, composto de dois módulos, em um “rack”, com suas colunas de som e os seus respectivos suportes laterais. Na parte de cima do “rack” ficava instalado o misturador, para seis microfones, e na parte de baixo, o amplificador de potência. Naquele época, era um dos melhores. Comparando-se ao que existe hoje é como se estivéssemos utilizando uma mesa de som estéreo, com “tudo que tem direito” e muita qualidade e potência de som. Cada aquisição de equipamento causava intensa satisfação para todos, como esse serviço de som A-100, comprado na Mesbla.

Num dos carnavais  que tocamos em Cascavel descobrimos que o som estava baixando (oscilando) muito por causa de uma válvula que estava frouxa em seu suporte. Quente para caramba, mas o Marcílio, que foi o cantor daquela jornada momina, de vez em quando ficava apertando a tal válvula para que o som melhorasse. Ele lembra e ri muito desse lance até hoje. No ano seguinte surgiram outros modelos, o A-200 e o A-300, um pouco melhores e mais potentes.

Pouco a pouco, com o avanço tecnológico, novas marcas e modelos de amplificadores apareceram no mercado. Fomos renovando nosso equipamento, pouco a pouco. Surgiram os amplificadores “Tremendão”, da Gianinni, com potência de 100 Watts de saída, para guitarras, órgãos eletrônicos, voz e contrabaixo. Essas “caixas” permaneceram bastante tempo no mercado e tinham uma saída incrível. Todo mundo desejava ter um amplificador “Tremendão”.  O amplificador tinha quatro válvulas de saída de áudio tipo “6L6”, que produziam uma sonoridade aveludada, um som mais puro. Para as caixas de contrabaixo usávamos as válvulas “EL-34”, que se encaixavam nos mesmos soquetes (encaixes para válvulas) mas que tinham um som mais agressivo e duro, bem apropriado ao instrumento. Essas máquinas resistiam bem à rotina de ensaios e funções variadas, com transportes para lá e para cá toda hora.

Outra novidade que os amplificadores Tremendão trouxeram foi o Reverber. Consistia em um circuito ligado a um módulo que ficava dentro do amplificador, numa caixa metálica com duas molas e pequenas bobinas, que pelo circuito eletrônico produziam  reverberação no som. O reverber enriquecia a qualidade de áudio nos solos e também em marcações feitas pelas guitarras. Depois de acostumados a ele, parece que incorporávamos sua sonoridade. A reverberação por ele produzida podia ser controlada através de botões específicos, no amplificador. Quando apresentava algum defeito, aí complicava. Era a desvantagem: quando um fiozinho desligava lá por dentro, em especial do compartimento metálico de molas e minúsculos transformadores, disparava uma microfonia (aquele apito bem alto, que incomoda bastante) para valer. E aí o Reverber tinha que ser desligado imediatamente, pois a microfonia tornava-se insuportável. Não posso falar de reverber sem mencionar a música “O Milionário”, que sem esse recurso era quase impraticável de ser executada. Em algumas festas, quando essa música estava “na parada”, cheguei a tocá-la inúmeras vezes.

-      O amplificador True Reverber (Gianinni)

Usamos esse amplificador para a guitarra-solo. Tinha excelente qualidade, mas pouca potência sonora. Quando se aumentava o volume mais um pouco o som ficava distorcido.

-      A caixa e amplificador Alex

Esse amplificador possuía muita potência. Nos causou espanto pela primeira vez que tivemos que abri-lo, para substituir um alto-falante que estava com problemas. Tentamos abrir a caixa da forma convencional e conseguimos ver os alto-falantes. Depois de alguns minutos alguém notou uma abertura dentro da caixa, e ao olharmos para cima logo os encontramos, mas em posição não convencional, ou seja, virados para baixo. A arquitetura sonora era diferente das demais, que tinham os alto-falantes parafusados na parte frontal da caixa de som.

Havia uma preocupação e a necessidade de trocar de equipamentos com relativa freqüência, em razão da concorrência. Por isso mesmo é que a maioria dos conjuntos não agüentava a barra e ia à falência cedo. Por outro lado, para economizar também fazíamos reformas nos equipamentos, como troca de cobertura de napa, cantoneiras, pintura de suportes e outras. Cansei de passar noites quase inteiras, madrugada adentro, retirando coberturas de napa dos amplificadores e das caixas de som e recobrindo-os com novo material. Dava um trabalho lascado. Puxa aqui, estira dali e pronto. Amplificadores e caixas novos de novo! Volta e meia ficava um canto mal feito mas tudo bem, não dava para ninguém notar e a economia tinha sido feita...

Desse modo o esforço estava plenamente recompensado pelo prazer de nos apresentar com um instrumental novinho, bonito, e com um som legal.
  
-      Os consertos de emergência e as improvisações

Muitas vezes tínhamos que fazer consertos de emergência nos amplificadores, na Capital ou no interior do Estado, quase sempre com pouco ou nenhum material específico. As válvulas de saída de áudio eram a “EL-34” e a “6L6”, que tinha um som melhor. Num desses dias, em Pacoti, foi feita uma solda em um fio da bobina de um reverber, com um ferro de soldar enorme, aquecido por uma forja. Vejam a “sutileza” dessa soldagem.

Em outra oportunidade o Carló desmontou um amplificador de contrabaixo, durante um baile, conseguiu localizar o defeito e trocar um resistor (componente eletrônico), tendo o equipamento voltado a seu funcionamento normal depois daquela rápida intervenção. Mas a verdade é que muitas vezes não conseguimos nos sair tão bem. Em algumas oportunidades os amplificadores pifaram mesmo, para valer, e não teve jeito. Nós sabíamos, mais ou menos, quando o defeito era sério, pela experiência. E também o bom senso para decidir se daria ou não tempo para consertá-lo na hora, coisa muito difícil, por inúmeras razões: falta de peças ou componentes eletrônicos, falta de meios técnicos apropriados, de material e de tempo para o reparo. Em virtude disso, houve períodos que o Big Brasa sempre andava com um amplificador de reserva, para qualquer emergência.

-      Os cabos e as extensões, sempre problemáticos

Tenho que falar dos cabos. Cabos e mais cabos “coaxiais”, para ligações dos diversos instrumentos (guitarras, contrabaixo, microfones e teclados) aos amplificadores e as extensões elétricas. Não podia confiar neles, nem em seus “plugs” ou conectores. Mesmo quando não apresentavam defeito durante as apresentações, quando alguém neles pisava, ou simplesmente suas ligações se rompiam com nossos movimentos, no dia seguinte eu ia examinar um por um. Isso porque na hora de dobrá-los, ao fim dos bailes,  poderia dar problema e alguma ligação se romper. Pegava logo o ferro de soldar, solda, alicate de corte, sentava-me no chão ou em algum banquinho e começava a revisão. Meu filho Alberto Neto, ainda criança, invariavelmente ficava me “ajudando” nessas manutenções.

-      A famosa “mala-da-cobra”

Em geral, todo técnico que se preza e também os conjuntos musicais têm uma “mala da cobra”. Chamávamos de “mala-da-cobra” toda caixa, bolsa ou qualquer outro tipo de depósito para transportar os cabos, as extensões e outras miudezas necessárias ao funcionamento do conjunto, tipo “plugs” diversos, conectores, tomadas, fita isolante, parafusos extras e tudo aquilo que se imagina que poderá quebrar numa apresentação. A tal mala deveria conter ainda ferramentas de primeira necessidade, para as emergências.

Esse nome “mala-da-cobra” se justificou muito bem quando, em uma ocasião, o conjunto tinha acabado de tocar em um clube de Sobral e ao final da festa fomos guardar as tumbadoras em seus estojos de proteção. Dentro deles foi encontrada uma cobra. Que susto. A cobra, certamente se encantou com o som do Big Brasa e com o calor dos estojos. 

-      A primeira bateria
 
Toda azul, com as partes metálicas de cor cinza metálico, foi adquirida da charanga do Gumercindo, líder da torcida do Fortaleza Futebol Clube. Lembro como se fosse hoje da alegria que todos sentimos quando chegamos em casa, após meu pai ter concretizado o negócio. No primeiro mês de utilização ela sofreu uma avaria. Quebrou um suporte. Só para vocês terem uma idéia, para que o bombo se sustentasse em pé era preciso colocar um transformador velho de lado para servir de apoio... Assim mesmo velha, recebeu logo uma pintura nova e nos prestou inestimáveis serviços. Possuía boa sonoridade.

        -  A bateria  “Pinguim”
 
Em madrepérola branca, de marca Pingüim, uma das melhores no momento, era de excelente qualidade e muito bonita. Foi comprada em São Paulo. A mamãe na época negociava bordados com minha Tia Zenóbia, que residia em São José dos Campos. Aproveitando uma das transferências de dinheiro que receberia dessas vendas, pediu ao tio João que fizesse a compra de uma bateria novinha em folha. Quando este instrumento chegou foi motivo de admiração por todos nós. A bateria depois de montada ficou linda. O meu pai, na preocupação de preservá-la em bom estado, mandou logo fazer uns estojos para todos os seus apetrechos. Por essa excelente providência é que essa bateria teve longa duração, sempre bem conservada e em ordem.

-      A distorção caseira

Sempre gostei de eletrônica, montagem de “kits” de alarmes sonoros, sirenes para discoteca, compressores de áudio e outros circuitos eletrônicos. Ainda em São José dos Campos, quando criança, gostava demais de brincar com tudo aquilo que tinha eletrônica. Montava e desmontava lanternas, pequenos circuitos para acender foquitos de lanterna, com instalações feitas na parte de baixo de mesas e camas. Mexia e fuçava em brinquedos eletrônicos, sempre que podia. A eletrônica e tecnologia moderna sempre me fascinaram.

Com 14 anos, fiz por correspondência um curso de rádio e televisão pelo Instituto Universal Brasileiro. Consegui aprender um bocado de coisas e montei um rádio, sob a orientação e com todos os componentes fornecidos pelo Instituto, como parte do treinamento. De vez em quando estava eu gostava de pesquisar as novidades, na Rua Pedro Pereira, local onde se encontra em Fortaleza o maior número de lojas de produtos eletrônicos. Conhecia todas as lojas e muitos vendedores, e como bom cliente, principalmente durante a existência do Big Brasa, obtinha bons descontos em todas as compras.

Essa relativa habilidade que tenho para eletrônica me ajudou muito durante toda a minha vida, desde criança, passando pela juventude, no Big Brasa, mais tarde no campo do radioamadorismo e até hoje em dia, com a Informática. A prática e a iniciativa incentivam o processo de criatividade e vice-versa. Digo isso para demonstrar como é que foi o lance da primeira distorção do Big Brasa e de Fortaleza. Para que os mais novos tomem conhecimento, ocorreu uma verdadeira pesquisa, coroada de êxito. Foi assim.

Ao ouvir umas gravações, a fim de escolher músicas para nosso repertório, notava alguns sons de guitarras super pesados, mas não sabia como é que os caras conseguiam aquilo. Vendo um filme musical e lendo um pouco sobre conjuntos, soube que existia um “aparelho”, que conectado à guitarra, produzia aquele som rachado e distorcido. Esse tal aparelho era a distorção. Fiquei louco de vontade de conseguir um som daquele tipo e comecei a falar com todo mundo que eu achasse que poderia ter uma idéia. Escrevi uma carta para o tio João e, depois que ele fez sua pesquisa em São Paulo, não conseguiu descobrir nada. Na verdade eu nem sabia o nome do aparelho direito, muito menos ele, que leigo em música, não deveria saber ou entender do tal som que eu procurava. Pois olhem, aí vai a dica: quando desejarem alguma coisa, finquem o pé e batalhem, lutem e tomem iniciativas, que certamente serão bem recompensados. Continuei procurando o tal aparelhinho - e sem nada conseguir.

Um belo dia, em minhas conversas com os colegas, disse para o Júlio Matos, o Julinho, que estava querendo comprar uma distorção mas não sabia onde. Para meu espanto ele me falou que tinha uma revista de eletrônica com um “esquema”, ou seja, o diagrama de montagem de uma distorção. Foi demais! O bom é que o Julinho gostava do assunto e sempre foi um técnico muito competente e pesquisador. Além disso, ele ficou interessadíssimo e disse que poderia tentar montar a tal “distorção”. Compramos todos os componentes necessários para a montagem e depois de poucos dias estava ele, o Julinho, chegando lá em casa com uma caixinha de metal, tirada de alguma sucata, que deveria ter sido de alguma outra montagem ou experiência anterior. Com muito cuidado, localizamos quais os locais de entrada e de saída de som, para que a guitarra fosse conectada ao aparelho, e este ao amplificador. Fizemos os cabos necessários, todas as devidas soldas, “plugs” e pronto. Preparamo-nos para o resultado. Acreditem: neste momento mais parecíamos dois soldados tentando desarmar uma mina, na expectativa de uma explosão, tal era nosso grau de ansiedade. Suspense total. Após ligar tudo, peguei a guitarra e toquei algumas notas. De início, nenhuma alteração e ficamos naquela, os dois meio sem jeito, sem olhar um para o outro. Fui tocando mais um pouco e mexendo nos dois potenciômetros (botões de regulagem e outras funções) que o aparelhinho possuía. De repente, o som ficou mais forte e pesado, começando a distorcer. Nessa hora, eu comecei a rir muito e a dizer:

- É isso aí, olha cara, esse é o som que estava querendo, deu certo!

O Julinho estava incrédulo, visto que ele próprio não sabia que som ou efeito sua montagem seria capaz de produzir.

-      O primeiro pedal tipo “wah-wah” de Fortaleza
 
O conjunto sempre procurou criar um diferencial, fazer inovações. Por exemplo, o Big Brasa foi o primeiro conjunto de Fortaleza a usar o pedal conhecido como “wah-wah”. Eu tinha visto esse tipo de pedal em um filme e apreciei muito os efeitos que produzia. Expliquei como funcionava e para que servia e o tio João se encarregou de fazer a aquisição para nós, em São Paulo.

Inauguramos o “wah-wah” durante todo o Festival Nordestino da Música Popular, realizado no Náutico Atlético Cearense, que teve como vencedora a música Beira-Mar, do Ednardo, acompanhado pelo Big Brasa. Ligado à guitarra-solo produzia sons diferentes e foi motivo de admiração. Algumas pessoas chegavam a ficar com a boca fazendo o movimento correspondente ao “wah-wah”.

Ao longo de minha carreira como guitarrista-solo usei várias marcas de pedais desse tipo. Sua característica, para quem é leigo ou não conhece esse pedal de efeito, é a de possibilitar a que o músico alterne rapidamente, através de movimento com o pé, um som agudo para um grave ou vice-versa, produzindo efeitos espetaculares. Daí o nome desse pedal ser “wah-wah”.

Em uma de nossas idas a Parnaíba, um músico local me fez uma proposta vantajosa para comprar meu “wah-wah”. A quantia que ele oferecia daria para eu comprar dois pedais novos. Animado, concretizei o “grande negócio”. E “dancei”, porque ao chegar a Fortaleza e manter ligações com o tio João, descobri que aquele pedal não era mais fabricado e tive que optar por uma marca pior, quase com o mesmo custo.

-      A minha guitarra “Supersonic”

Tive umas quatro ou cinco guitarras durante a existência do Big Brasa. Cuidava muito bem delas, como até hoje tenho zelo por tudo que possuo. O músico que se preza tem que tratar bem seu instrumento, conservando-o sempre da melhor maneira possível. Uma dessas guitarras, a que mais gostava, chegando mesmo a “conversar” com ela às vezes, foi uma “Supersonic”, fabricada pela Gianinni. No princípio eu a usei por algum tempo sem modificação nenhuma.  Essa guitarra possuía uma característica importante para um solista. Com ela eu conseguia utilizar a alavanca diversas vezes sem que ela perdesse a afinação (para quem é músico fica fácil entender). Nos improvisos em rocks e blues coisa fundamental. Mesmo assim, um dia resolvi dar uma melhorada nela, em suas formas e em seu som. Desmontei-a por inteiro, inclusive seus componentes eletrônicos, como os três captadores de som, sistema de alavanca, molas, cavalete, braço e tudo. Ao final estava completamente desmontada. Eu olhava para as peças e pensava: será que vai dar certo? Com uma pequena serra e depois lixas, cortei um pouco suas formas de modo a que ficasse parecida com uma “Gibson”, uma das melhores marcas do mundo. Depois começou a parte dos acabamentos. Apliquei massa como se faz numa pintura de automóvel, no sentido de laqueá-la. Adquiri um novo conjunto de captadores e escolhi um deles em substituição a um dos originais, por ter uma sonoridade bem interessante. Andei mexendo um pouquinho nos pequenos circuitos dos controles de graves e agudos, acrescentando ou modificando, na base da experimentação mesmo, alguns capacitores (componentes eletrônicos que, dependendo de onde são usados, alteram o som). A pintura, de branco, foi à pistola, com um cuidado todo especial. Ficou muito legal, parecendo até mesmo “de fábrica”. Passei então à fase crítica da montagem, para que ficasse afinando normalmente e conseguindo as “oitavas” numa boa. Com um encordoamento “zerado”, não lembro a marca, comecei a testar a “nova” guitarra. Deu certo! Estava com uma verdadeira “Gibson”, home-made, que me serviu por muito tempo e que até hoje me traz ótimas recordações.

-      O primeiro órgão eletrônico

A aquisição do primeiro órgão eletrônico - um Diatron - foi feita pelo meu pai, na Mesbla, através de um cartão de crédito, cujas prestações foram inúmeras e difíceis para serem quitadas. Lembro-me que ele reclamava bastante no final do mês, quando ao pagar a prestação a dívida pouco diminuía.

Com a presença do órgão o Big Brasa evoluiu muito, tendo em vista o aumento das possibilidades de arranjos, combinação das sonoridades, marcação rítmica e base harmônica mais completa, além dos próprios solos do instrumento. Esse Novatron não tinha muitos recursos, se comparado aos equipamentos modernos: vibrato e alguns timbres diferentes, com os controles de graves, agudos e volume, este feito através de um pedal que volta e meia apresentava defeito - quase sempre em seu cabo de ligação.

-      Ainda falando de teclados

No segundo órgão, que a fábrica chamou de Novatron, algumas novidades, mas a mesma essência. Nesse segundo equipamento é que houve a decepção, por parte do Mestre Alberto, quando encontrou o órgão, em um final de festa,  com as laterais do teclado e uma das teclas queimadas por um cigarro, por simples desleixo do organista. Ele fala nisso até hoje. Na verdade um músico que se preza e que compra seu instrumento com dificuldade, pelo menos em princípio deveria ter muito cuidado e zelo com ele.

Posteriormente, nos teclados que o Big Brasa usou, pudemos inovar bastante. Na época em que passei a tocar teclados, quando tive que substituir o Adalberto, adquiri três pedais (sustainner, phaser e flanger), os quais interligados ao órgão produziam sons bem diferentes dos usuais, despertando muita atenção por seus efeitos sonoros.

Além de órgãos eletrônicos utilizei diversos outros teclados, a exemplo de um sintetizador monofônico (para os que não leigos, que tocava uma nota de cada vez, não produzindo acordes). Pouco tempo depois fui à São Paulo e adquiri um sintetizador polifônico, mais moderno. Custou uma grana violenta. Com ele a parte harmônica podia funcionar, visto que os acordes soavam normalmente. Entretanto a dificuldade para programar os diferentes sons e efeitos era muito grande. Perdia muito tempo e tinha que ser mais operador do que músico. Não satisfeito com esse equipamento, troquei-o em Fortaleza por um órgão eletrônico de dois teclados e comprei um outro sintetizador, o Poly-800. Com o Poly-800 a gente tirava sons e efeitos incríveis. Daí por diante chegou a fase dos sintetizadores mais “pesados”, tipo DX-7, da Yamaha.

O primeiro modelo DX7 era excelente, em seus diversos aspectos. Com sua qualidade de som espetacular, o equipamento pesava aproximadamente oito quilos e possuía um teclado de cinco oitavas, muito macio. Possibilitava ao músico nele programar, ou seja, criar seus próprios sons e timbres à vontade e armazená-los  em sua memória. O DX7 já vinha com um cartucho com uma infinidade de sons programados, além daqueles previamente gravados de fábrica. Adquiri depois outros cartuchos RAM, aqueles nos quais se pode gravar, e assim pude gravar meus sons, timbres e combinações de sons prediletos para utilizá-los em outro DX7, se necessário, levando apenas os cartuchos previamente gravados.

Mais tarde consegui adquirir também um teclado Roland, modelo E-20, de excelente qualidade. Com esse instrumento, eu e o Airton França formamos uma dupla muito legal. Ele com um violão Ovation, de sonoridade ótima, cantando (muito bem, por sinal) e até mesmo tocando piston, e eu fazendo alguma parte de vocalização e tocando órgão e sintetizador. Na fase dos órgãos eletrônicos modernos, cheguei a utilizar alguns desses teclados que “fazem tudo”, com bateria, baixo, harmonia e efeitos para solo de diversos tipos. Chamados também de “desempregadores” de músicos, visto que um tecladista com um desses equipamentos pode substituir um conjunto inteiro, dependendo do ambiente que esteja trabalhando.

Associado a esses órgãos eletrônicos cada vez mais perfeitos, hoje em dia mantenho ainda um sintetizador DX7 - II, da Yamaha, que possibilita centenas de possibilidades de programação, enfim, um instrumento utilizado pelos melhores grupos não só do Brasil mas do mundo inteiro. Com esse DX7, utilizo também um teclado Roland, de sonoridade excelente.

Meus filhos, Alberto Neto e Cristiane, desde pequenos demonstraram uma grande afinidade pela música. “Filho de peixe, peixinho é”, diz o ditado, pois mesmo quando crianças sempre gostavam de tocar em instrumentos musicais de brinquedo. Em nossa casa, para não “perder a forma”, ainda hoje mantemos uma pequena sala de música, com teclados, guitarra, pedais, microfones, amplificadores, caixas de som, estante, partituras e outros acessórios, onde todos nós somos freqüentadores. De vez em quando estamos por lá para “tirar um som”.


João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999) 

O estilo de repertório do Big Brasa


O estilo de repertório do Big Brasa


O Conjunto Big Brasa sempre teve um repertório variado, que atendesse à maioria. Tocava músicas de muitos estilos, sendo preferencialmente um conjunto de iê-iê-iê, ritmo quente no movimento que constituiu a Jovem Guarda. Mas quando tocávamos no interior, tínhamos que estar preparados para tocar de tudo. Xotes, forrós, sambas, boleros, mambos e valsas. O que desse e viesse...

Quando você está em algum baile e observa os conjuntos musicais mudarem de uma música para outra, sem interrupções bruscas, como se tudo fosse automático, certamente existe um planejamento criterioso ou então muita prática para que isso ocorra. O roteiro musical escrito serve, principalmente, para que o líder do grupo possa lembrar todas as músicas disponíveis no repertório, evitando assim o chamado “branco de memória”, tão comum de acontecer para quem está tocando. Por isso mesmo, para qualquer das funções musicais que o Big Brasa fosse participar, o roteiro das músicas, por escrito, sempre foi peça fundamental.

A responsabilidade pela seqüência das músicas a serem tocadas era minha, assim como a de avisar a todos os músicos no palco qual seria a música seguinte. Uma preocupação a mais, além de tocar o próprio instrumento. Com a prática, sabíamos mais ou menos a ordem como as músicas deveriam ir sendo tocadas. A gente estabelecia, para facilitar, sinais ou gestos que representavam uma determinada música ou uma seqüência previamente ensaiada. Nesses roteiros, muitas músicas não figuravam com seus nomes corretos. E outras vezes nem chegávamos a saber o nome real da música, sendo muito fácil a gente encontrar em um repertório, músicas como “Rapado em Fá”, “Rita Lee nova”, “Tema Seis”, dentre outras denominações. Portanto, eu procurava organizar o repertório de uma forma que as músicas iniciais fossem leves. E seguia depois, gradativamente, até a uma grande animação, que poderia ser obtida tanto com rocks, sambas ou forrós. No meio dos bailes, tocávamos músicas lentas por um bom tempo, para o descanso geral e para a dança colada, a verdadeira hora do “amasso”. Depois o conjunto chegava a “temperatura máxima” de novo, para fazer um intervalo, de trinta minutos, com a festa no auge. Após a pausa, entrávamos quase sempre como no começo e terminávamos o baile com todas as músicas mais animadas do repertório, para fechar “com chave de ouro”. Isso tudo dependia muito do local e do público onde estávamos nos apresentando. A seqüência do repertório, na realidade, não era rígida. Essa flexibilidade significava quebrar a ordem determinada pelo roteiro para atender a um pedido ou solicitação de alguém, desde que a mudança não atrapalhasse o ritmo da festa. Quem tinha essa função, não estava livre de erros. Uma escolha de música, feita de modo errado, podia esvaziar o salão repentinamente.

Guardei até hoje muitos roteiros usados pelo Big Brasa em seu repertório. Quem participou do conjunto deverá lembrar, com certeza, de algumas das seguintes músicas, as quais estão transcritas como foram grafadas na época e em ordem alfabética:


A Candinha  - A Distância - A Little Bit Me - Além de Tudo - All My Love For You - Assim falou Zaratustra  - Baiana - Be My Lover  - Beautiful You - Because I Love You
Ben - Besame Mucho - Black Power - Blue Suede Shoes - Boys  -Bridge Over Touble Water –Carimbós - Cavalo Ferro – Chililique - Chuva, suor e cerveja - Cold Turkey
Colírio - Como vai você - Contos de Areia – Cubanacan - Day Tripper - De noite na cama - Deep Purple – Desacato – Diana - Dia dos Santos Reis - Dizzy miss lizzy
Don’t say goodbye - Duzentas Milhas - É onda -  Eu bebo sim - Everything I Own - Evil Ways - Fellings  - Fio Maravilha - Forever and Ever - Garota de Ipanema - Green Piper
Guajira - Hello Dolly - Hey amigo - Hey Girl - I Saw Her Standing There - I’m going home - Imagine - In-agada-da-vida - Jumpin Jack Flash - Killing me softly - Lado direito
Last time – Listen - Live love maid - Ma Cherie Amour – Magia  Maxixe -  Me deixa em paz – Moments - Moon River - Mother’s Daughter - Mrs. Robinson - Music and me
Namoradinha - Nega de Obaluaê -  Noites de Moscou - Not a second time - Nothing Else - O amor é a razão - O que é bom tá guardado - O show já terminou - Oh me Oh my
One Day in Your Life - Only You - Oye come vá – Paraíba – Paramaribo - Pau-de-Arara - Pisa na Barata - Porta Aberta - Por amor / Michelle - Preta, pretinha - Quantas Lágrimas - Rapados em si bemol - Rita Jipe - Salve Nossa Senhora - Samba de verão - Samba pa ti - See me, feel me - Silêncio da Madrugada - Skyline Pigeon - Slow Down
So lucky - Só o amor constrói – Summertime - Susie “Q” - Tell me Once Again - Tema de Marylin - Tema do Aeroporto - That’s What I Want - Traces  - Tutti Frutti - Under my Thumb - Vô batê pa tu / Urubu - Vou Recomeçar - Xaxado  - Xodó - You are the sunshine - Zazueira

-      A inclusão de músicas antigas no repertório

Outra novidade que apresentávamos desde o início do conjunto, por sugestão de meu pai, foi a inclusão de músicas antigas com ritmos e arranjos modernos. “Peguei um Ita no Norte” iniciava uma das seqüências. O pessoal do conjunto não vibrava muito com isso, mas na verdade causou grande sucesso. Essa fórmula posteriormente foi - e ainda está sendo até hoje - utilizada por inúmeros artistas, cantores e grupos musicais.

-      Idéia excelente, dificuldade para a execução

O Mestre Alberto tentou inovar mais uma vez, através da idéia de apresentar “slides” com o título de cada música do repertório, que seriam  projetados no palco durante as festas. Desse modo o público ficaria vendo a projeção do nome das músicas tocadas.

A seqüência desses “slides” seria a mesma que a do repertório. Excelente idéia mas muito onerosa e de execução difícil, por isso mesmo deixou de ser implantada. Ele próprio, no intuito de melhor organizar o repertório, chegou a datilografar fichas para cada música, como em um arquivo, catalogando mais de 200 títulos de diversos estilos.

Vejam vocês que tudo isso ocorreu por volta de 1967 a 1969, quando nem se pensava em programas de computadores capazes de fazer apresentações magníficas, telões, “data-show” e demais recursos tecnológicos da atualidade.

Outra tentativa de meu pai foi a de gravar todas as músicas tocadas durante os eventos. Mais uma vez a falta de recursos financeiros de nossa parte e também de tecnologia. Ainda não tínhamos os gravadores de fita cassete. O gravador que ele usava, funcionava com fitas de rolo e possuía um mecanismo muito problemático. Além disso as gravações tinham que ser feitas nos palcos, com o som ambiente, pois não se utilizava naquele tempo recursos como saídas de áudio em linha dos amplificadores ou mesas de som.

Fitas de vídeo, nem pensar. Conhecemos o videoteipe mais ou menos em 1971, com as antigas máquinas de videoteipe da TV Ceará, também com fitas enormes. Acho até que nem existem registros em vídeo dessa emissora. Os programas gravados num dia era apagados pouco tempo depois, com novas gravações, pela necessidade de reutilização das fitas.

João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)