quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O desejo da profissionalização


O desejo da profissionalização


 
Tão logo que possível regularizamos nossa situação junto à Ordem dos Músicos do Brasil, Secção do Ceará e com o Sindicato dos Músicos do Ceará. Tudo providenciado pelo papai, pois nós mesmos só queríamos saber de tocar. Aliás, hoje vejo que isso é perfeitamente normal. Na adolescência é difícil ver algum jovem preocupado com os aspectos legais, burocráticos e coisas do gênero. O Registro do nome “Big Brasa” foi feito no Cartório de Registro de Títulos e Documentos de Fortaleza. Inicialmente todos os músicos tinham carteiras provisórias. Depois, com a devida habilitação, receberam as carteiras profissionais definitivas. Ao longo da existência do Conjunto outros músicos participaram com carteiras provisórias. Mas todo mundo tinha que estar devidamente regularizado.

CONTRATOS E HORÁRIOS

Quando o Big Brasa foi registrado oficialmente e todos os seus músicos foram legalizados frente à Ordem dos Músicos do Brasil, Secção do Ceará, bem como junto ao Sindicato dos Músicos, todos nossos contratos passaram a ser devidamente registrados. Inúmeras vezes - é importante lembrar - minha mãe, Dona Zisile, como a chamavam, se deslocou para a Ordem e Sindicato para registrar nossos contratos.

Mandamos fazer um papel timbrado para os contratos do Big Brasa, de modo a facilitar seu preenchimento. Esse formulário continha cláusulas relativas ao contratante, ao tempo de duração do evento, à forma de pagamento, preço da hora de prorrogação e a relação dos músicos do conjunto, com seus respectivos números de carteiras profissionais da OMB ou licenças temporárias. Tinha que ser registrado em cinco vias.

No que se refere ao cumprimento desses contratos e dos horários, o Big Brasa era muito caprichoso. Eu próprio fazia questão de chegar ao local dos eventos bem antes, para acompanhar e instalar todo o equipamento, afinar o instrumental, testar os amplificadores, fazer a distribuição do som de maneira adequada ao ambiente etc. Após tudo isso sempre mantinha contato com o contratante ou responsável no sentido de dizer que tudo estava em ordem e pronto para o início no horário determinado.

Foi um dos primeiros conjuntos que começaram a tocar apenas bailes de quatro horas de duração em Fortaleza, com meia hora de intervalo. Os outros conjuntos tocavam festas de cinco horas. Mas isso, enfatizo, somente na capital porque no interior do Estado a coisa pegava. Tínhamos que enfrentar verdadeiras batalhas. Festas de cinco, seis e até sete horas de duração, quando havia prorrogações. A legislação específica estabelece que os músicos devem tocar no máximo 45 minutos, com intervalo de 15 minutos por cada hora. Mas no Ceará esse dispositivo nunca foi cumprido.

Em uma ocasião, chegamos ao ponto de deixar de fazer um contrato financeiramente compensador porque já havíamos firmado outro compromisso, para tocar de graça, a título promocional. Responsabilidade não é para qualquer um...

PROFISSIONALISMO - UMA PALAVRA FUNDAMENTAL

Em qualquer trabalho, para que se obtenha pleno êxito e destaque, o profissionalismo tem que existir. Dentro dos princípios que regem um bom profissional, se encaixam diversos aspectos, como responsabilidade, habilidade naquilo que executa (que é conseguida através do estudo e do trabalho), respeito aos companheiros de profissão, coleguismo, disciplina e perseverança nos objetivos, entre outros.

No caso do músico, especificamente, isso tudo deve ser multiplicado por dois, ou seja, o esforço tem que ser duplicado, para superar aquela imagem de que todo artista é relaxado, desligado, “lunático” e até mesmo alienado.

Para mencionar um simples exemplo, uma vez fui tachado pejorativamente de “aquele guitarrista”, pela mãe de uma namorada. Não deixei por menos, conversei demoradamente com aquela senhora, de modo que ela soubesse que estava falando com um cara sério, de boa família e de bons princípios. E através de meus procedimentos consegui que ela e seus familiares modificassem o conceito que faziam sobre mim, pelo fato de ser músico.

Por esses e outros fatores, é que formulei uma proposta de trabalho para o exercício de minhas funções profissionais, de modo a tentar, de todas as maneiras possíveis, desfazer essa imagem negativa, que o músico ainda possui, para uma parcela da população. Tarefa difícil, pelo preconceito existente com a profissão de músico, mas não impossível, pois consegui fazer a minha parte, de manter a dignidade da profissão e lutar contra o preconceito.

João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

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