quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A sociedade com “Os Faraós”


A sociedade com “Os Faraós”



O conjunto “Os Faraós” foi um dos grupos de rock de muito sucesso que existiu em Fortaleza. Formado por quatro irmãos, Luisinho, Sebastião, Vicente e Antônio, tinha uma marca registrada: repertório quase que totalmente direcionado para músicas em inglês. Não tocava um samba nem para fazer remédio, como se diz popularmente. Sempre muito bem ensaiado, possuía um vocal muito bom e apurava seus arranjos de forma a ficarem idênticos aos originais. Seu líder era o habilidoso guitarrista-solo Luisinho, também  possuidor de uma magnífica voz. O som dos “Faraós” era inconfundível. O meu pai sempre disse que gostava mais dos Faraós do que dos Beatles.

 E justificava sua afirmação para o Luisinho, dizendo que ouvia os Beatles com a razão e os Faraós com o coração.
 
Contingências da vida. Não foi bem uma sociedade, com contrato escrito e demais características. Passei a integrar o conjunto “Os Faraós”, como tecladista, alguns meses após o Big Brasa ter encerrado suas atividades. Nessa época os “Faraós” também estavam um pouco desmobilizados e as condições do mercado de trabalho não eram muito favoráveis, pela existência de uma grande quantidade de conjuntos em Fortaleza naquele período, além das inúmeras discotecas que invadiram a cidade com som mecânico, tomando o campo de trabalho dos músicos. Eles se encontravam sem parte do instrumental e eu com todo o material do Big Brasa. Foi uma junção perfeita, pois o grupo “Os Faraós” passou a contar com a minha modesta participação como tecladista, mas que certamente veio mudar a sonoridade característica do conjunto e enriquecer musicalmente o grupo, também pelo fato do teclado aumentar as possibilidades de arranjos e de estilo de repertório.     

Nos primeiros ensaios, fizemos todas as devidas adaptações de nosso instrumental. Alguns amplificadores do Big Brasa, somados com as excelentes caixas de som Bussfle fabricadas pelos próprios “Faraós”, acessórios de toda ordem e o conjunto ficou pronto. Havia muita empolgação no ar e ânimo por parte de todos, visto que o “Big Brasa” e “Os Faraós” não se consideravam rivais e juntos, por várias vezes participaram de diversas promoções de grande sucesso em Fortaleza. Cada um tinha o seu público e o seu estilo definido.

Foram inúmeros os bailes e shows que participei nessa temporada com “Os Faraós”, entre os anos de 1973 e 1977. No palco sempre muita potência de som, volume alto, jogo de luzes e efeitos diversos que eram experimentados a cada tempo. Havia uma mesa de luz e de efeitos, por exemplo, que comandava inclusive a explosão das chamadas “bombas de fumaça”, criadas por nós, de fabricação caseira. Essas bombas eram caixas retangulares de madeira com fusíveis de pedaços de fio, nas quais colocávamos, a princípio, somente pequena quantidade de pólvora. O problema era quando o Castorino exagerava nas porções de pólvora e a “chibatada” era grande. Nas seqüências mais animadas de rocks ou nas músicas que antecediam os intervalos as bombas de fumaça eram disparadas. A pólvora queimava e subia rapidamente se espalhando por todo o palco e encobrindo totalmente os integrantes do conjunto. Produzia um efeito visual excelente, mas em compensação o cheiro da pólvora era de amargar. Resolvemos esse problema mais adiante, misturando incenso à pólvora. A luminosidade dos disparos também ficou mais clara e bonita. Chegamos até a utilizar extintores de incêndio para produzir efeitos em meio a tudo.

Quanto às luzes, chegamos a utilizar até oito lâmpadas estroboscópicas distribuídas pelo palco, mais dezesseis refletores coloridos. Em algumas oportunidades usamos também gelo seco, para produzir aquela cortina de fumaça branca que ficava espalhada por todo o ambiente. Dia a dia criávamos mais novidades e o pessoal gostava muito. A mistura desses efeitos com o pesadíssimo som que tirávamos era sensacional e às vezes impressionante.

Nós tínhamos muito cuidado na preparação dos efeitos, principalmente das bombas de fumaça, para que não houvesse acidentes. Mas sempre tem aqueles que não se preocupavam muito com o perigo. Uma noite em Maranguape, antes de acionar duas bombas de fumaça e extintores eu avistei um cara encostado no palco, de costas para o conjunto. Larguei imediatamente os teclados e fui alertá-lo no sentido de que ele estava muito próximo das bombas e que aquilo ali iria “explodir” para cima. Como o conjunto estava tocando a pleno vapor, e o som do instrumental muito alto, tive que gesticular bastante, apontando para os dispositivos, para que ele me entendesse. Mas o elemento nem ligou, permanecendo na mesma posição. Como não tinha outro jeito e tudo estava posicionado corretamente, no momento determinado o nosso bigu detonou duas bombas de fumaça e eu acionei os extintores. Tudo isso ao mesmo tempo. Foi uma cortina de fogo tão grande atrás desse cara que ele se assustou e afastou-se, meio chamuscado, “fedendo a cão”. Nós quase morremos de achar graça do susto que ele levou. Depois disso fizemos intervalo, no qual soubemos que o dito cujo estava reclamando por que o conjunto tinha queimado um pouco sua camisa nova. Que pena... Falta de aviso não foi.

Em outra oportunidade, no Clube Vila União, soubemos que um garçom tinha corrido em direção ao bar, gritando para todos que o palco estava pegando fogo, porque viu fumaça saindo por cima do teto. O aviso quase causou pânico generalizado, se não tivesse sido desmentido a tempo. Foi a maior gozação em cima do rapaz, via-se logo que ele ainda não conhecia nossos “efeitos especiais”.

Nossos maiores embalos sem dúvida foram realizados no Memphis Club, de Antônio Bezerra. Eram festas animadíssimas, descontraídas, o público gostava demais do conjunto e vibrava com o nosso som e efeitos apresentados. Apesar da responsabilidade pelos contratos nessa época ser do Luisinho, eu sempre me preocupava muito com tudo. Inclusive com a montagem do instrumental. O meu amigo Sérgio Alves, anteriormente bigu do Big Brasa, passou a nos acompanhar e muito nos ajudou também nesse período. Fazia tudo com boa vontade, mesmo sabendo que para desmontar toda a fiação no final de cada baile, mais de duzentos metros de fios e cabos tinham que ser dobrados e guardados, além das pesadíssimas caixas de som, amplificadores e acessórios diversos. Guardo ótimas recordações desse período em que integrei “Os Faraós”. Nossa convivência e relacionamento foram excelentes. Sempre admirei muito o Luisinho como solista e como cantor e sentia que a recíproca era verdadeira, no que se refere a minha participação no conjunto como tecladista. 


João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

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