quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O Big Brasa e as funções em Fortaleza


O Big Brasa e as funções em Fortaleza


A falta de um telefone

No princípio não tínhamos telefone próprio, fator que em muito dificultou a procura do conjunto, mas por isso mesmo nós hoje sabemos o quanto o Big Brasa era valorizado, pois mesmo sem telefone os contratos não paravam... O telefone mais perto de nossa casa ficava na residência da Dona Nadir. Era um daqueles “macacos-pretos”, como os radioamadores chamam, que tinham uma pequena alavanca ao lado, a qual acionada fazia soar a campainha de uma mesa telefônica do posto telefônico de Messejana, para que este completasse a ligação para Fortaleza. O sistema, muito precário em vista do que temos hoje, funcionava assim: nós girávamos a tal alavanquinha várias vezes até que alguém do posto telefônico atendesse. Fornecíamos o número a ser chamado e a atendente pedia para que a gente desligasse e ficasse aguardando. Quando ela conseguia, retornava a ligação. Muitas vezes levava uma hora ou mais, pois dependia do número de chamadas que tinha que fazer no momento. O nosso primeiro telefone, de nº 26-40-91, foi adquirido pelo meu pai em um dos planos de expansão da TELECEARÁ. Este telefone funcionava em uma central nova e ligava direto para Fortaleza, sem necessidade da intermediação do antigo posto telefônico. Uma melhoria formidável, portanto.  Com o telefone próprio, mandamos imprimir cartões e outros impressos, para ajudar em nossa divulgação. Até hoje mantenho guardado o meu primeiro cartão de visita, como guitarrista-solo do Conjunto Big Brasa. 

APRESENTAÇÕES EM FORTALEZA

-      15 anos no Bairro de Fátima

Outra das apresentações iniciais do conjunto foi em uma festa de aniversário, em uma residência no Bairro de Fátima. Para vocês terem uma idéia da situação, o conjunto tocava com suas guitarras e bateria e todo mundo cantava sem microfone nenhum, na marra, no sacrifício mesmo. Essa função musical durou mais ou menos umas duas horas. Isso foi no tempo em que o instrumental e todo o grupo cabiam, com algum aperto, é claro, em um jipe 51...

-      Os restaurantes da Beira-mar

Nos primeiros meses, após a estréia, o Big Brasa conseguiu alguns pequenos contratos, ainda verbais, para tocar em restaurantes na avenida
Beira-Mar. Dentre eles o Bayuca, e posteriormente também outros, na Praia do Futuro. Para nós o rendimento daquelas apresentações era insignificante, mas era tudo o que tínhamos. Para não “passarmos em branco” os sábados à noite ou matinais aos domingos, era “pegar ou largar”, como se diz.

Na realidade, ganhávamos muito pouco ou quase nada. O conjunto recebia uma quantia que dava apenas para o pagamento do transporte e para um minúsculo “cachê” para cada músico. Ao final da noite, recebíamos uma refeição completa do restaurante. Pelo menos isso! O “esquema” naquele tempo, para quem estava iniciando, era esse mesmo, não tinha outra saída. O que procurávamos era a promoção do conjunto, aparecer para o público e tornar o Big Brasa conhecido em Fortaleza. Mas, para garotos como nós, todos na faixa de 15 para 17 anos, tudo era novidade...

Nessas tocatas, o conjunto ficava muito exposto ao público, quase sempre sem um local com proteção adequada, com os microfones de vez em quando sendo derrubados por garçons ou clientes, cabos e extensões elétricas pisados e todas as desvantagens de se trabalhar com instrumentos musicais e equipamentos eletrônicos sem estar em um palco. 

Com o passar de alguns meses, nosso trabalho surtiu efeito. Começamos a receber contratos para festas particulares de 15 anos, verdadeira moda naquele tempo, e também de outros clubes. Aí sim, felizmente pudemos deixar de lado os tais contratos com  restaurantes.

-      Tertúlias na Sociedade Bairro de Fátima

Por várias vezes o Big Brasa se apresentou em um clube chamado Sociedade Bairro de Fátima. Quase sempre as tertúlias tinham início com pouca gente, o que desanimava extremamente todo o grupo. Mas depois de algum tempo o pessoal ia chegando, devagarinho e as festas terminavam animadíssimas. Um dos garçons dizia para o  Mestre Alberto: - Aqui é assim mesmo, começa fraco e depois melhora.

Na Sociedade Bairro de Fátima ocorreu um episódio digno de registro. Nunca esqueci aquela noite. Nós estávamos tocando uma tertúlia normalmente e o público naquela ocasião era razoável. De cima do palco vimos uma equipe entrando pelas laterais do salão. Era o pessoal de um conjunto de Recife, com um instrumental bem mais moderno que o nosso. No intervalo ficamos sabendo que o grupo iria fazer um show. Ficamos observando aqueles amplificadores modernos, material muito bom. Esse conjunto iniciou sua apresentação “rachando”. Sabem como é? Quando um conjunto vai se apresentar por pouco tempo, seleciona as melhores músicas, aquelas que causam impacto e “sentam o porrete”. Essas músicas são chamadas de “cavalos de batalha”. Depois que o curto show acaba, quem fica, ou seja, o conjunto que estava tocando o baile, que se vire para superá-lo. Foi uma verdadeira barra. Vimos o pessoal desmontar seu instrumental e depois subimos ao palco novamente para continuar a festa. Reiniciamos com uma seqüência de solos de guitarra, acho que do “The Pop’s”. Estava trêmulo, mas com o tempo o pessoal foi entrando no salão para dançar e o nervosismo acabou. 

-      As tocatas em Mondubim

O Big Brasa também enfrentou paradas difíceis em Mondubim. Tertúlias mal divulgadas, certamente, e população pequena do bairro contribuíam para isso, entre outros fatores que desconheço. O Big Brasa se esforçava muito para animar o salão, eu tentava de tudo, modificando o repertório,  alternando estilos e ritmos mas não adiantava nada.

-      Os programas de Rádio

O Big Brasa participou de alguns programas de rádio levados “ao ar” pela Rádio Assunção, Rádio Dragão do Mar de Fortaleza e Ceará Rádio Clube.
 
O primeiro deles foi na Rádio Assunção, em um programa apresentado pelo radialista Aurélio Brasil. As condições técnicas para a apresentação de um conjunto musical eram mais do que sofríveis. Um estúdio apertadíssimo, de uns 10 metros quadrados mais ou menos, apenas um microfone para captar todo o som do instrumental e das vozes (imaginem só) e a apresentação ao vivo. O operador de áudio desse programa, mesmo se quisesse ou se soubesse, não teria nenhuma condição de mixar um instrumento ou equalizar o som geral do grupo. Saía do jeito que fosse mesmo, tudo na base da improvisação. Nesse dia todos estávamos muito nervosos com a expectativa dessa apresentação. O nervosismo se acentuava quando alguém nos avisava de que o programa começaria dentro de instantes e logo depois a gente via a indicação “NO AR” acender, dentro de estúdio.

Um fato interessante, que nos chegou ao conhecimento muito tempo depois de ter acontecido, foi que durante a apresentação do Big Brasa nesse referido programa de rádio, o nosso amigo Lúbi-Lúbi, de Messejana, que era auxiliar do programa, nos intervalos chegou para nós com a notícia de que os telefones da emissora não paravam de tocar, segundo ele os ouvintes elogiando o conjunto e pedindo mais músicas. O Lúbi-Lúbi fez isso para nos incentivar e até hoje todos nós somos a ele muito gratos, pois o choque não teria sido nada agradável para quem estava principiando. A verdade, nesse caso por ele escondida, é que o pessoal telefonava para pedir para nos “tirar do ar”.

Ainda na Rádio Assunção, mais tarde chegamos a fazer gravações de “jingles” para algumas empresas locais, com o Mauro Coutinho como técnico de som, e a nos apresentar no Auditório, com platéia, também em programas ao vivo, mas com melhores condições acústicas para melhor exibição. No mesmo período participamos de programas semelhantes transmitidos pela Rádio Dragão do Mar de Fortaleza. O apresentador era o Jurandir Mitoso, muito brincalhão e que ficou sendo nosso amigo e incentivador. Nesses programas o Jurandir Mitoso, entre uma música e outra, fazia perguntas sobre o grupo, nos entrevistando sobre a programação para o fim de semana. Sempre nos deu a maior força.

Na Ceará Rádio Clube não houve participação do Big Brasa, mas sim várias gravações individuais, com solos de guitarra feitos por mim, para a escolha de “sinais de tempo” para as transmissões de partidas de futebol, a convite do Mauro Coutinho. O sinal de tempo, para quem não sabe, é aquele rápido som ou efeito que precede o aviso, pelo locutor, de quanto tempo de jogo é decorrido. Usava a criatividade e efeitos com distorção para gravá-los. Lembro-me que alguns deles passaram muito tempo sendo utilizados e quando eu os ouvia sentia um prazer enorme pela autoria.


João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

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