quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A participação do Big Brasa na televisão


A participação do Big Brasa na televisão


O Conjunto Big Brasa teve uma presença marcante e freqüente na televisão cearense, por quase sete anos, fator que influiu de forma significativa na divulgação do grupo em Fortaleza e de modo especial no interior cearense.

O ingresso do Conjunto na televisão deu-se por ocasião de um Festival Nordestino da Música Popular, quando o Big Brasa acompanhava o Ednardo, na música “Beira-Mar”, no Náutico Atlético Cearense. Nessa ocasião o conjunto estava muito bem ensaiado e produzia arranjos musicais belíssimos nas músicas que executava. Na final desse festival a música do Ednardo tirou o primeiro lugar, fato amplamente noticiado através da imprensa local.

Nessa apresentação o grupo foi observado pelo radialista e apresentador de TV, Augusto Borges, que comandava naquela época o programa “Show do Mercantil”, levado ao ar aos sábados pela TV CEARÁ, Canal 2, antiga emissora de Rede Tupi de Televisão (cujo logotipo era um indiozinho). Esse programa era patrocinado pelo Mercantil São José. Pois bem, o Augusto ficou empolgado com o Conjunto e naquela oportunidade nos convidou para participar de seu programa. Assim foi o início de nosso contato com a televisão.

O PROGRAMA “SHOW DO MERCANTIL”
 
O Show do Mercantil, levado ao ar aos sábados, pela extinta TV Ceará, Canal 2, da Rede Tupi de Televisão, quase sempre apresentava muitos quadros interessantes e de bom conteúdo. Durante muito tempo do programa o “layout” do palco do Show do Mercantil tinha como pano de fundo o Big Brasa. Assim, qualquer que fosse a atração, estávamos lá aparecendo na TV, o que contribuiu de forma significativa para nossa maior divulgação no interior do Estado.

No decorrer dos programas o Augusto Borges freqüentemente se dirigia ao Big Brasa, fazendo um comentário ou simplesmente brincando com algum de nossos componentes. Desse modo nossa imagem se propagou rapidamente e nos tornamos muito conhecidos pelo público em geral.

-      Como era o Show do Mercantil

Durante o período letivo o quadro Colégio contra Colégio encarregava-se de animar o programa suficientemente, pelas disputas entre os estudantes. Tínhamos que nos policiar no que diz respeito à postura no palco, pois o tempo de duração era de duas horas e meia e cansava ficar todo esse tempo em pé. Nos intervalos a gente saía “de fininho” para a ante-sala, para bater papo e descansar um pouco. Para quem fumava era uma boa, pois dava tempo para acender um cigarrinho de leve.

-      Seleção de calouros - uma “boca quente”

A participação musical do Big Brasa no Show do Mercantil iniciava às noites das quartas-feiras, quando eu, na qualidade de produtor musical, fazia uma seleção de calouros para se apresentar no programa seguinte. Tudo funcionava assim: no auditório da TV Ceará os candidatos chegavam cedo. Eu iniciava o ensaio por volta das 20:00h. Ao piano, no palco, ia chamando os calouros por ordem de chegada e, um a um, perguntava-lhe que música que gostaria de ensaiar. Depois do acompanhamento de cada candidato, fazia algumas anotações para escolher os melhores ao final. Tive que enfrentar vários problemas, de gente desafinada e sem ritmo, mas que pensa que sabe cantar. Em cada ensaio eu ouvia em média trinta candidatos para escolher apenas quatro, estes que ensaiariam na sexta-feira com todo o conjunto.  Às vezes a escolha ficava difícil e eu tinha que escalar os menos ruins, de qualquer jeito...

Num desses ensaios, ao anunciar a relação dos quatro calouros para sexta-feira, um cara, alto e desengonçado, veio me questionar sobre o porquê de não ter sido escolhido. Gentilmente expliquei a ele que deveria treinar mais, ouvir mais a música escolhida, enfim, todas as explicações necessárias ao caso. Mas ele, inconformado, cada vez mais ia se exaltando. E eu também ia perdendo a paciência, que nunca foi grande mesmo. Ao final, virei para o “candidato a calouro” e tive que lhe dizer a verdade, nua e crua:

- Meu amigo, sem ritmo, cantando desafinado e errando a letra da música, não dá. É por isso que você não tem condições para se apresentar. E sendo assim, enquanto eu estiver aqui, você não cantará no programa.

Foi o suficiente para que eu recebesse um desaforo e uma ameaça de tiro, que felizmente ficou só na ameaça.

Ao contar o fato para o Augusto Borges, mencionando a ameaça recebida, ele me perguntou, com a maior calma:

- Beiró, o cara disse mesmo que iria atirar em você?

- Sim, respondi preocupado.

- Então pode ficar sossegado que ele não vai fazer nada, tranqüilizou-me.

-      O ensaio geral do Show do Mercantil

Realizado às sextas-feiras, quando o “script”, ou roteiro do programa estava pronto. Quase sempre enfadonho, principalmente quando a produção tinha algum novo elemento querendo “aparecer”. No que se refere à parte musical o conjunto Big Brasa ensaiava com os calouros todas as músicas, com introduções, até que ficassem “no ponto”, nem que fosse no ponto de errar no sábado, como alguns faziam, face ao nervosismo ... Depois desse ensaio geral as entradas das músicas eram repassadas de forma muito rápida, só para relembrar, no sábado, antes do início do programa, com o Big Brasa no palco do programa, a postos.

-      Artistas que o Big Brasa acompanhou

Vários foram os artistas que o Big Brasa acompanhou, muitos de projeção nacional. Foram seis anos e meio, com atrações todos os sábados e em muitos desses programas cantores de fora, quase sempre vindos do sul do País.

A seguir estão listados alguns deles, em ordem alfabética: Adriano (Francisco de Assis), Carlos Imperial, Belchior, Cauby Peixoto, Cláudia Barroso, Demétrius, Dóris Monteiro, Ednardo, Jorge Melo, Luís Vieira, Mardônio, Márcio Greick, Pablo Sebastian, Rodger, Sandra, Wanderley Cardoso, dentre outros.

-      Nosso encontro com o “Rei do Baião”

Em uma das tardes de sábado, o Big Brasa estava cumprindo função no Show do Mercantil. Com o auditório praticamente lotado, o programa naquele dia apresentaria muitas atrações. Não seria monótono, como em outras vezes.

A produção musical, de minha responsabilidade, tinha preparado alguns novos cantores da terra, saídos da seleção de calouros. Além disso apresentaria o próprio quadro de calouros e alguns números do Big Brasa, músicas de sucesso recentemente ensaiadas. Nessa época, havia um quadro chamado “Fora de Série”, no qual se apresentavam mágicos, malabaristas, contorcionistas, enfim, todas as pessoas que faziam alguma coisa diferente, motivo de atração. Esse quadro permaneceu no ar por muito tempo e tivemos a oportunidade de presenciar várias cenas ou atrações super interessantes. Para aquele dia, a produção do programa, através de diversas “chamadas” - pequenos comerciais do programa exibidos durante a programação durante a semana - tinha anunciado uma grande surpresa para o público.

No início do programa, o Augusto Borges adiantou a atração, que seria o famoso compositor e músico Luiz Gonzaga, nada menos do que o “Rei do Baião”, como ficou conhecido internacionalmente. Durante os intervalos, de pequena duração, a gente saía um pouco do nosso palco, que ficava na lateral do cenário principal, para conversar com o pessoal da produção e outros colegas, na ante-sala do programa, bastante movimentada. Nesse dia, estávamos também querendo ver, de perto, o “Rei do Baião”. Em uma dessas saídas, nos deparamos com o Luiz Gonzaga, na ante-sala, sentado com sua sanfona, calmamente aguardando a vez de sua apresentação. O meu pai, muito entusiasmado com aquele encontro, visto ser um dos fãs daquele artista, disse para o pessoal do conjunto, na frente do Luiz Gonzaga, em tom de brincadeira:

- Vocês deveriam se perfilar e fazer continência, em homenagem a “esta verdadeira fera”, referindo-se ao Luiz Gonzaga.

Ele permaneceu sentado e, sorrindo bastante para todos nós, respondeu:

- Deixe os meninos, que eles estão “na deles”...

E nós todos cumprimentamos o famoso Rei do Baião, com muita satisfação por mais aquele encontro com gente famosa. Naquele momento, o Luiz Gonzaga deixou a impressão, para mim, de ser um artista extremamente simples e simpático, além naturalmente de tudo aquilo que produziu em seu inestimável legado musical.

-      Os operadores de câmeras
 
Os que trabalharam durante mais tempo conosco foram o Fred e o William. Eles tinham que ter muita agilidade nas operações com seus equipamentos, particularmente no início, com as câmeras RCA, americanas,  em preto e branco. Elas não possuíam o recurso de aproximação, o “zoom”, tão comum hoje em dia em qualquer filmadora. Na frente de cada câmera existia o que eles chamavam de “torre de lentes”, ou seja, um conjunto de quatro lentes que eles tinham que alternar de acordo com a distância dos objetos em foco. Havia o perigo, por exemplo, de um câmera-man, inadvertidamente, mudar de lente quando a sua câmera estivesse “no ar” - a chamada falha técnica.

De vez em quando eu gostava de brincar com as câmeras e pedia para que os operadores me deixassem trabalhar um pouquinho com elas durante os programas. Isso acontecia mais com a câmera 3, que me parece era a que mais folgava.

-      A equipe de produção do Show do Mercantil

O programa foi produzido por muito tempo pelo Tertuliano Siqueira, filho do falecido guitarrista Paulo de Tarso, que hoje trabalha para o grupo do jornal “O Povo”, auxiliado pelo Oliveira Martins. O “Terto”, como alguns o chamavam, tinha boas idéias. Produzir e dirigir um programa de televisão semanal, em Fortaleza, com duas horas de duração, não é fácil. O cara tem que “se virar” para arranjar matérias e atrações. Entrevistas diversas, artistas de fora do Estado e curiosidades, como o quadro “Fora de Série” faziam parte do show.

O Big Brasa quase sempre apresentava um número na abertura e mantinha algumas músicas para preencher alguma lacuna. Acompanhava a apresentação dos calouros e praticamente todos os cantores que vinham do Sul do País para temporadas em Fortaleza. Adquirimos muita experiência musical por causa disso. Tínhamos mesmo que saber, ou seja, conhecer bem as harmonias, os acompanhamentos de tudo que é música ou então “ter ouvido” para pegar o acompanhamento na hora do ensaio, rapidamente. E depois, memorizar tudo aquilo para não falhar durante o programa, sempre realizado “ao vivo”.

-      A distribuição das sacolas e brindes

Um dos momentos que mais agradava ao público presente no auditório, que ficava bastante agitado, era quando o Augusto Borges mandava distribuir as sacolas do Mercantil São José, sempre recheadas com diversos produtos de qualidade. O Mercantil encaminhava para a TV Ceará uma porção de mantimentos, que ficavam armazenados em um depósito para serem acondicionados em sacolas e distribuídos ao público no decorrer dos programas.

Todos os participantes do Big Brasa recebiam uma sacola, às vezes até mais de uma. O motorista, Fernando “Galba”, bigus, auxiliares, pessoal da produção do programa, todo mundo se fazia direitinho.

-      As paqueras durante o programa

Sempre havia muita movimentação no Show do Mercantil, de modo especial quando o período escolar tinha início e o quadro “Colégio contra Colégio” também. Auditório lotado, muita gente mesmo. Nos bastidores do mesmo jeito. Quem conhecia as dependências da TV Ceará, seus corredores amplos, sabia como chegar ao auditório do programa “por dentro”. E aí ficava sempre meio tumultuado, com o pessoal querendo ver os artistas, batendo papo, desejando receber uma sacola “por fora”, o que não era permitido.  Na realidade, sempre estive  muito ocupado - e preocupado - durante o programa para que tanto a minha participação como produtor musical e a do Big Brasa fossem satisfatórias. E nesse clima havia paqueras de todo o lado, além de sempre existir um grande batalhão de meninas e moças que desejavam “entrar” para a TV de qualquer modo, como cantora ou garota-propaganda.

-      A repercussão do “Show do Mercantil” no interior do Estado

Se em Fortaleza a televisão divulgava o Big Brasa suficientemente, no interior a penetração do Big Brasa era intensa, a divulgação era enorme. No início apenas a TV Ceará existia. E por isso mesmo durante muitos anos sua imagem foi  única no interior do Estado, em se tratando de grupos musicais.

Imaginem só, nos anos de 1970, um conjunto que aparecia todos os sábados num programa de audiência total no interior, visto que a EMBRATEL ainda não possibilitava transmissões do Sul do país. Quando o Big Brasa chegava a qualquer cidade interiorana, obtinha enorme repercussão. Em muitos municípios fomos recebidos com faixas de boas-vindas na frente dos clubes! A rapaziada local ficava com um ciúme danado por que suas paqueras e namoradas se voltavam para nós, tudo muito natural, por ser novidade, essas  coisas de tietes. 

Foi nesse esquema que praticamente se desenrolou a bem sucedida etapa televisiva do Big Brasa, cujos episódios serão motivo de diversos enfoques nesses registros.

O PROGRAMA “ESTÚDIO 2”

Programa de muita audiência, no qual o Big Brasa se apresentou por quase três anos. Levado ao ar diariamente pela TV Ceará, cada programa abordava, através de entrevistas, temas diversos, dirigidos principalmente às mulheres. Diversos artistas nacionais, cantores, pessoal de teatro e outras personalidades de destaque participaram do “Estúdio 2”.

Dentre os que eu lembro a Dercy Gonçalves, com duas brincadeiras, mas com bem menos palavrões, tendo em vista a censura existente no período. O famoso músico Zé Menezes também foi acompanhado pelo Big Brasa. No dia em que esteve no programa, ele usou minha guitarra, para executar alguns solos e improvisos.  

Às vezes a contra-regra produzia um cenário um pouquinho melhor do que as simples cortinas e tapadeiras, que eram divisórias de compensado para encobrir um ou outro defeito do cenário. Colocavam mesas e cadeiras como num bar, com platéia,  e o ambiente ficava mais alegre e descontraído.  A luta do pessoal do estúdio era sempre no sentido de manter o silêncio daqueles que não estavam em cena, para não atrapalhar o programa , realizado “ao vivo”.

Durante praticamente toda a semana deixávamos o instrumental no amplo estúdio da TV Ceará onde se realizava o “Estúdio 2”. Esse material era levado para casa apenas para os ensaios do conjunto. Para nós, músicos e o restante do pessoal que ali trabalhava o horário não era fácil. De Messejana eu saía em nosso jipe 51, com o Adalberto, mais ou menos às 11:15h., de segunda a sexta-feira.

Nós costumávamos dividir as despesas com a gasolina. Nunca deixamos de cumprir esse horário, certinho.

O som do “Estúdio 2” sempre foi melhor que o do Show do Mercantil. Deve-se isso, com certeza, aos operadores de áudio e de microfones, além da própria acústica do ambiente. No estúdio a distribuição se fazia com uma “girafa”, que para quem não sabia é um suporte bem grande, na forma de um guindaste, que podia movimentar o microfone por cima de todo mundo, captando bom o som de cada cena. Havia também os microfones de lapela e os “varacionais”, explico: como a TV não possuía microfones direcionais, aqueles que captam bem o som em uma determinada direção, o pessoal da equipe técnica adaptava um microfone comum, forrado com esponjas, a uma vara ou haste de metal ou madeira. Por causa dessa improvisação, ficaram conhecidos por nós como os microfones “varacionais”. 

Os câmeras procuravam “detalhes” em todos os lugares que podiam para ser mais criativos. Lembro-me muito bem do William (o “Irmão”, já falecido), do Fred (atualmente na TV Educativa) e o Zé Lenir, o mais calmo e de menos iniciativa. O “Irmão” e o Fred se destacavam como bons profissionais. Na verdade eles eram muito bons mesmo. O Fred, bastante dinâmico, se deslocava rapidamente para conseguir os melhores ângulos para as imagens que o suíte (diretor de imagens) solicitava. Por falar em “suíte”, os dois diretores de imagens que mais trabalhavam naquele tempo nos programas em que o Big Brasa participava eram o Dedeco (Aderson Maia) e o Gonzalez, este principalmente no Estúdio 2. Bem, eles nos colocavam “no ar” diversas vezes sem estarmos tocando, em qualquer posição que estivéssemos, de preferência quando a gente não notava que seria focalizado. Numa dessas vezes que os câmeras ficavam procurando o que mostrar pelo estúdio o Fred ficou me focalizando um tempão e eu, que estava prestando atenção ao que estava sendo exibido no programa, não notei. Deu sorte porque minha  imagem não tinha ido ainda ao ar. Quando notei o Fred tentando me enquadrar, num ato impulsivo e de pura brincadeira, “dei o dedo” para a câmera. Resultado: depois do programa o Gonzalez desceu da “Engenharia”, como chamávamos, e me deu uma boa chamada, dizendo ele que “quase” apertou no botão que levaria aquele gesto para todos os cearenses. 

O conjunto fazia em média dois números por programa. No decorrer dessa temporada a propaganda que o conjunto conseguiu foi enorme, por aparecer diariamente na TV. As músicas quase sempre eram sucessos do momento, cantadas pelo Edson ou pelo Lucius. Tocávamos “temas” de improviso e blues, ocasiões em que eu aproveitava para “tirar” sons de todas as maneiras que sabia, na guitarra, fato que contribuiu para minha relativa projeção como guitarrista-solo em Fortaleza.

Conseguimos um fã-clube espalhado pelo interior do Estado. Todos os dias recebíamos cartas e mais cartas. Umas eram dirigidas ao Conjunto Big Brasa, de um modo geral. Outras eram destinadas aos músicos, em particular. Acho que os campeões de correspondência eram o Edson Girão e o Lucius.

Ainda hoje mantenho quase todas as cartas que recebi, muitas delas com fotos e até declarações amorosas, com muito carinho e afeto. Sentia um prazer enorme ao receber cada cartinha daquelas. Andei respondendo muitas, pessoalmente. Depois, pela falta de tempo, contratamos uma amiga que respondia tudo por nós. Tive  que fazer uma fotografia minha ao lado do caminhão de transmissões externas do Canal 2 e distribuí 500 (quinhentas) cópias para o fã-clube do conjunto no interior do Estado. Hoje em dia ainda mantenho estas cartas bem guardadas, pois fazem parte de nossa memória.

Ainda sobre fotografias do conjunto, é bom contar que fizemos uma “mutreta” um dia, quando um cara estacionou com um automóvel conversível “Lorena”, em frente ao Canal 2, para resolver algum assunto de seu interesse. Como estávamos aguardando o horário do Estúdio 2 entrar “no ar” chamamos rapidamente o fotógrafo da televisão e fizemos uma pose junto ao tal carro. Foram feitas centenas de fotos e enviadas também para o interior. Isso certamente contribuiu para nossa imagem de conjunto “rico”, com o carro dos outros ...

Tínhamos que inventar novidades. Eu às vezes até abusava dos pedais (distorção e "wah-wah") e brincava com os câmeras que se aproximavam demais de minha guitarra no intuito de mostrar minha aliança para as fãs do interior.

De tão acostumados com as câmeras e com o pessoal do estúdio todo, contra-regras, operadores de microfone, os próprios câmeras-man, a gente se divertia muito. Eu não perdia nenhuma oportunidade de improvisar sobre os temas das músicas que tocávamos. Era uma boa forma de exercitar e também de mostrar para o Ceará inteiro nossas habilidades.

No entanto um dia o produtor do programa resolveu abrir mais um espaço para uma entrevista com o conjunto, a pedido das fãs. O entrevistador foi o Flávio Torres. Dirigiu perguntas principalmente para o Lucius e algumas para mim, sobre nossa atuação em Fortaleza, quis saber se respondíamos as cartas do pessoal, enfim um bocado de coisas. Fiquei, como sempre, um pouco nervoso ao ser entrevistado. Senti que o sangue me fugiu e que deveria estar muito pálido. Mas felizmente a TV ainda era em preto e branco... Na foto que temos desta entrevista aparece a atriz de novelas e apresentadora Carla Peixoto, da TV Ceará.

Toda a vez que eu tinha que falar em público ficava um pouco nervoso. Podia cantar, tocar, enfim, fazer tudo, que me sentia bem, completamente à vontade. Mas falar em público, principalmente na televisão, que você fala para uma platéia e também para uma câmera, sempre foi um problema para mim. Uma vez, por exemplo, ao gravar uma aula em vídeo para a TV Educativa, no qual eu aparecia tocando uma música ao piano e em seguida teria que fazer um comentário musical e falar um pouco sobre o Paulinho da Viola, esqueci o texto várias vezes.

OS FESTIVAIS NORDESTINOS DA MÚSICA POPULAR

Pouco antes da final de um dos Festivais Nordestinos da Música Popular que o Big Brasa participou em Recife, defendendo músicas do Ednardo, adquirimos, por intermédio do tio João, em São Paulo, dois “wah-wah” de marca nova. A idéia era usar um para a guitarra-solo e outro para o órgão. A aquisição desses equipamentos foi um verdadeiro show de competência. Tudo muito rápido, o pedido ao tio João, a aquisição, a remessa e enfim a chegada dos pedais em tempo recorde. Fomos receber a encomenda no departamento de bagagens da VARIG, quase às 11 horas da noite. Deu tudo certo, os pedais foram incorporados a nosso instrumental e utilizados de acordo com o planejamento. Sobre esse evento, realizado em dezembro de 1971, trecho de uma nota publicada por um jornal cearense:

- “Está seguindo na próxima sexta-feira para a capital pernambucana a equipe de compositores e intérpretes que apresentarão as composições selecionadas em Fortaleza para concorrer ao II Festival da Música Nordestina. Entre a turma de músicos cearenses destaca-se a participação do Conjunto Big Brasa, que defenderá as músicas Beira-Mar e Rua do Ouro, classificadas em primeiro e quarto lugares respectivamente”.

A respeito desse Festival, que foi televisionado para todo o Norte e Nordeste (na época uma transmissão por demais comentada), lembro de alguns acontecimentos interessantes. Um deles ocorreu durante o ensaio geral, no Ginásio Coberto localizado no bairro Embiribeira (idêntico ao Paulo Sarasate, porém mais bem acabado, com alojamentos e restaurante, e com uma área externa maior). Pois bem, o Big Brasa ao ensaiar com a orquestra de Recife, acompanhando Beira-Mar, do Ednardo, o maestro ficou entusiasmado com a música e o arranjo. Também entre os músicos da orquestra a opinião unânime foi a de que aquela música tiraria o primeiro lugar. Mas, como para ganhar em Recife não tinha jeito mesmo, ficamos apenas com um terceiro lugar e uma menção honrosa. Valeu, entretanto, a reportagem de três páginas na extinta Revista “O Cruzeiro”, sobre o  Festival, transcrevendo com destaque e na íntegra a letra de Beira-Mar e publicando a foto do Ednardo, acompanhado pelo Big Brasa e pela orquestra de Recife.

Um segundo lance desse festival: durante o intervalo da TV, quando nos preparávamos para entrar “no ar” com o Ednardo, o público do Ginásio, que estava completamente lotado, começou a vaiá-lo intensamente. E tome vaia, mesmo porque eles vaiavam tudo que fosse do Ceará. Um cara da platéia tocava uma buzina duas vezes e depois vinha a vaia.  Estávamos todos muito nervosos, evidentemente. Mas por felicidade e presença de espírito, talvez, peguei o tom daquela buzina na guitarra e, com o “wah-wah”, após o cara tocá-la, reproduzi o som no palco com a guitarra a plena altura. O pessoal gostou, o negócio virou brincadeira, alguns aplaudiram até e a vaia cessou de repente. Foi ótimo para todos nós. Por último faço questão de registrar aqui a verdadeira e inadmissível “melada” do maestro da orquestra pernambucana, que na hora de começar a apresentação do Ednardo, veio me perguntar o andamento da música para fazer a introdução. Eu expliquei para ele e cantei as primeiras notas da melodia, no andamento correto. Qual foi nossa surpresa quando esse maestro iniciou Beira-Mar com um andamento completamente acelerado. Nosso baterista estava com a orquestra. Foi uma luta nos segundos iniciais para tentar fazer o andamento retroceder ao original, uma verdadeira briga entre a orquestra e o Conjunto. De propósito ou não isso certamente contribuiu para atrapalhar o Ednardo, que ficou mais branco do que pó de giz durante toda a música. Esse “pequeno deslize” do maestro pernambucano, de propósito ou não, prejudicou de forma significativa nossa “performance” naquela noite.

Nas folgas, depois dos compromissos com ensaios, saíamos em grupo para conhecer os pontos principais de Recife. Quase tudo financiado pela TV Ceará, ou Diários e Emissoras Associados do Ceará, da Rede Tupi. Conhecemos duas adegas muito bonitas e aconchegantes, que apresentavam shows noturnos. A Adega do Bocage e da Mouraria. Estivemos também na praia da Boa Viagem e em algumas boates da cidade.


João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)

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