A sociedade com “Os Faraós”
O conjunto “Os Faraós” foi um dos grupos de rock de muito sucesso que existiu em Fortaleza. Formado
por quatro irmãos, Luisinho, Sebastião, Vicente e Antônio, tinha uma
marca registrada: repertório quase que totalmente direcionado para
músicas em inglês. Não
tocava um samba nem para fazer remédio, como se diz popularmente.
Sempre muito bem ensaiado, possuía um vocal muito bom e apurava seus
arranjos de forma a ficarem idênticos aos originais. Seu líder era o
habilidoso guitarrista-solo Luisinho, também possuidor
de uma magnífica voz. O som dos “Faraós” era inconfundível. O meu pai
sempre disse que gostava mais dos Faraós do que dos Beatles.
E justificava sua afirmação para o Luisinho, dizendo que ouvia os Beatles com a razão e os Faraós com o coração.
Contingências
da vida. Não foi bem uma sociedade, com contrato escrito e demais
características. Passei a integrar o conjunto “Os Faraós”, como
tecladista, alguns meses após o Big Brasa ter encerrado suas atividades.
Nessa época os “Faraós” também estavam um pouco desmobilizados e as
condições do mercado de trabalho não eram muito favoráveis, pela
existência de uma grande quantidade de conjuntos em Fortaleza naquele
período, além das inúmeras discotecas que invadiram a cidade com som
mecânico, tomando o campo de trabalho dos músicos. Eles se encontravam
sem parte do instrumental e eu com todo o material do Big Brasa. Foi uma
junção perfeita, pois o grupo “Os Faraós” passou a contar com a minha
modesta participação como tecladista, mas que certamente veio mudar a
sonoridade característica do conjunto e enriquecer musicalmente o grupo,
também pelo fato do teclado aumentar as possibilidades de arranjos e de
estilo de repertório.
Nos
primeiros ensaios, fizemos todas as devidas adaptações de nosso
instrumental. Alguns amplificadores do Big Brasa, somados com as
excelentes caixas de som Bussfle fabricadas pelos próprios “Faraós”,
acessórios de toda ordem e o conjunto ficou pronto. Havia muita
empolgação no ar e ânimo por parte de todos, visto que o “Big Brasa” e
“Os Faraós” não se consideravam rivais e juntos, por várias vezes
participaram de diversas promoções de grande sucesso em Fortaleza. Cada um tinha o seu público e o seu estilo definido.
Foram
inúmeros os bailes e shows que participei nessa temporada com “Os
Faraós”, entre os anos de 1973 e 1977. No palco sempre muita potência de
som, volume alto, jogo de luzes e efeitos diversos que eram
experimentados a cada tempo. Havia uma mesa de luz e de efeitos, por
exemplo, que comandava inclusive a explosão das chamadas “bombas de
fumaça”, criadas por nós, de fabricação caseira. Essas bombas eram
caixas retangulares de madeira com fusíveis de pedaços de fio, nas quais
colocávamos, a princípio, somente pequena quantidade de pólvora. O
problema era quando o Castorino exagerava nas porções de pólvora e a
“chibatada” era grande. Nas seqüências mais animadas de rocks ou nas
músicas que antecediam os intervalos as bombas de fumaça eram
disparadas. A pólvora queimava e subia rapidamente se espalhando por
todo o palco e encobrindo totalmente os integrantes do conjunto.
Produzia um efeito visual excelente, mas em compensação o cheiro da
pólvora era de amargar. Resolvemos esse problema mais adiante,
misturando incenso à pólvora. A luminosidade dos disparos também ficou
mais clara e bonita. Chegamos até a utilizar extintores de incêndio para
produzir efeitos em meio a tudo.
Quanto
às luzes, chegamos a utilizar até oito lâmpadas estroboscópicas
distribuídas pelo palco, mais dezesseis refletores coloridos. Em algumas
oportunidades usamos também gelo seco, para produzir aquela cortina de
fumaça branca que ficava espalhada por todo o ambiente. Dia a dia
criávamos mais novidades e o pessoal gostava muito. A mistura desses
efeitos com o pesadíssimo som que tirávamos era sensacional e às vezes
impressionante.
Nós
tínhamos muito cuidado na preparação dos efeitos, principalmente das
bombas de fumaça, para que não houvesse acidentes. Mas sempre tem
aqueles que não se preocupavam muito com o perigo. Uma noite em
Maranguape, antes de acionar duas bombas de fumaça e extintores eu
avistei um cara encostado no palco, de costas para o conjunto. Larguei
imediatamente os teclados e fui alertá-lo no sentido de que ele estava
muito próximo das bombas e que aquilo ali iria “explodir” para cima.
Como o conjunto estava tocando a pleno vapor, e o som do instrumental
muito alto, tive que gesticular bastante, apontando para os
dispositivos, para que ele me entendesse. Mas o elemento nem ligou,
permanecendo na mesma posição. Como não tinha outro jeito e tudo estava
posicionado corretamente, no momento determinado o nosso bigu detonou
duas bombas de fumaça e eu acionei os extintores. Tudo isso ao mesmo
tempo. Foi uma cortina de fogo tão grande atrás desse cara que ele se
assustou e afastou-se, meio chamuscado, “fedendo a cão”. Nós quase
morremos de achar graça do susto que ele levou. Depois disso fizemos
intervalo, no qual soubemos que o dito cujo estava reclamando por que o
conjunto tinha queimado um pouco sua camisa nova. Que pena... Falta de
aviso não foi.
Em
outra oportunidade, no Clube Vila União, soubemos que um garçom tinha
corrido em direção ao bar, gritando para todos que o palco estava
pegando fogo, porque viu fumaça saindo por cima do teto. O aviso quase
causou pânico generalizado, se não tivesse sido desmentido a tempo. Foi a
maior gozação em cima do rapaz, via-se logo que ele ainda não conhecia
nossos “efeitos especiais”.
Nossos
maiores embalos sem dúvida foram realizados no Memphis Club, de Antônio
Bezerra. Eram festas animadíssimas, descontraídas, o público gostava
demais do conjunto e vibrava com o nosso som e efeitos apresentados.
Apesar da responsabilidade pelos contratos nessa época ser do Luisinho,
eu sempre me preocupava muito com tudo. Inclusive com a montagem do
instrumental. O meu amigo Sérgio Alves, anteriormente bigu do Big Brasa,
passou a nos acompanhar e muito nos ajudou também nesse período. Fazia
tudo com boa vontade, mesmo sabendo que para desmontar toda a fiação no
final de cada baile, mais de duzentos metros de fios e cabos tinham que
ser dobrados e guardados, além das pesadíssimas caixas de som,
amplificadores e acessórios diversos. Guardo ótimas recordações desse
período em que integrei “Os Faraós”. Nossa convivência e relacionamento
foram excelentes. Sempre admirei muito o Luisinho como solista e como
cantor e sentia que a recíproca era verdadeira, no que se refere a minha
participação no conjunto como tecladista.
João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)
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