O desejo da profissionalização
Tão
logo que possível regularizamos nossa situação junto à Ordem dos
Músicos do Brasil, Secção do Ceará e com o Sindicato dos Músicos do
Ceará. Tudo providenciado pelo papai, pois nós mesmos só queríamos saber
de tocar. Aliás, hoje vejo que isso é perfeitamente normal. Na
adolescência é difícil ver algum jovem preocupado com os aspectos
legais, burocráticos e coisas do gênero. O Registro do nome “Big Brasa”
foi feito no Cartório de Registro de Títulos e Documentos de Fortaleza.
Inicialmente todos os músicos tinham carteiras provisórias. Depois, com a
devida habilitação, receberam as carteiras profissionais definitivas.
Ao longo da existência do Conjunto outros músicos participaram com
carteiras provisórias. Mas todo mundo tinha que estar devidamente
regularizado.
CONTRATOS E HORÁRIOS
Quando
o Big Brasa foi registrado oficialmente e todos os seus músicos foram
legalizados frente à Ordem dos Músicos do Brasil, Secção do Ceará, bem
como junto ao Sindicato dos Músicos, todos nossos contratos passaram a
ser devidamente registrados. Inúmeras vezes - é importante lembrar -
minha mãe, Dona Zisile, como a chamavam, se deslocou para a Ordem e
Sindicato para registrar nossos contratos.
Mandamos
fazer um papel timbrado para os contratos do Big Brasa, de modo a
facilitar seu preenchimento. Esse formulário continha cláusulas
relativas ao contratante, ao tempo de duração do evento, à forma de
pagamento, preço da hora de prorrogação e a relação dos músicos do
conjunto, com seus respectivos números de carteiras profissionais da OMB
ou licenças temporárias. Tinha que ser registrado em cinco vias.
No
que se refere ao cumprimento desses contratos e dos horários, o Big
Brasa era muito caprichoso. Eu próprio fazia questão de chegar ao local
dos eventos bem antes, para acompanhar e instalar todo o equipamento,
afinar o instrumental, testar os amplificadores, fazer a distribuição do
som de maneira adequada ao ambiente etc. Após tudo isso sempre mantinha
contato com o contratante ou responsável no sentido de dizer que tudo
estava em ordem e pronto para o início no horário determinado.
Foi
um dos primeiros conjuntos que começaram a tocar apenas bailes de
quatro horas de duração em Fortaleza, com meia hora de intervalo. Os
outros conjuntos tocavam festas de cinco horas. Mas isso, enfatizo,
somente na capital porque no interior do Estado a coisa pegava. Tínhamos
que enfrentar verdadeiras batalhas. Festas de cinco, seis e até sete
horas de duração, quando havia prorrogações. A legislação específica
estabelece que os músicos devem tocar no máximo 45 minutos, com
intervalo de 15 minutos por cada hora. Mas no Ceará esse dispositivo
nunca foi cumprido.
Em
uma ocasião, chegamos ao ponto de deixar de fazer um contrato
financeiramente compensador porque já havíamos firmado outro
compromisso, para tocar de graça, a título promocional. Responsabilidade
não é para qualquer um...
PROFISSIONALISMO - UMA PALAVRA FUNDAMENTAL
Em
qualquer trabalho, para que se obtenha pleno êxito e destaque, o
profissionalismo tem que existir. Dentro dos princípios que regem um bom
profissional, se encaixam diversos aspectos, como responsabilidade,
habilidade naquilo que executa (que é conseguida através do estudo e do
trabalho), respeito aos companheiros de profissão, coleguismo,
disciplina e perseverança nos objetivos, entre outros.
No
caso do músico, especificamente, isso tudo deve ser multiplicado por
dois, ou seja, o esforço tem que ser duplicado, para superar aquela
imagem de que todo artista é relaxado, desligado, “lunático” e até mesmo
alienado.
Para
mencionar um simples exemplo, uma vez fui tachado pejorativamente de
“aquele guitarrista”, pela mãe de uma namorada. Não deixei por menos,
conversei demoradamente com aquela senhora, de modo que ela soubesse que
estava falando com um cara sério, de boa família e de bons princípios. E
através de meus procedimentos consegui que ela e seus familiares
modificassem o conceito que faziam sobre mim, pelo fato de ser músico.
Por
esses e outros fatores, é que formulei uma proposta de trabalho para o
exercício de minhas funções profissionais, de modo a tentar, de todas as
maneiras possíveis, desfazer essa imagem negativa, que o músico ainda
possui, para uma parcela da população. Tarefa difícil, pelo preconceito
existente com a profissão de músico, mas não impossível, pois consegui
fazer a minha parte, de manter a dignidade da profissão e lutar contra o
preconceito.
João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)
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