Ensinar o pulo do gato, nunca!
O Edson Girão sempre foi um excelente músico, particularmente no que se
refere à harmonia das músicas. Muito detalhista e possuidor de um
“ouvido” muito bom, conseguia aprender todos os acordes de uma música,
de qualquer estilo. Nos ensaios por vezes se tornava maçante, por ser
meticuloso demais. Podia demorar, mas só ficava satisfeito quando
executava o encadeamento harmônico perfeito da música, ou para os
leigos, o acompanhamento certinho. E nos mostrava em sua guitarra, com
muita satisfação, os acordes mais difíceis de serem percebidos e que ele
tirava “de letra”. Quando não conseguia perceber um detalhe harmônico
ele ficava visivelmente irritado, dizendo que estava “faltando alguma
coisa”. E persistia na busca da perfeição harmônica, sendo que no
momento que conseguia descobrir o tal acorde, imediatamente se
preocupava em ensiná-lo para nós, na primeira oportunidade que tivesse.
Enquanto
muitos conjuntos musicais aprendiam as músicas de maior sucesso no
momento “na marra” para logo incluí-las no repertório, mesmo que não
estivessem cem por cento corretas, o Edson chegava mesmo até a discutir
nos ensaios, no intuito de fazer prevalecer o seu ponto de vista – o de
executar as músicas com as harmonias corretas, com o qual concordo
plenamente.
Quase
sempre, de modo particular em cidades do interior do Estado, os músicos
locais compareciam aos bailes tocados pelo Big Brasa ou mesmo por outro
conjunto da capital para aprenderem “macetes”, harmonias novas,
conhecer um ou outro equipamento mais moderno, enfim, para aprender
mais.
Nós
conhecíamos de imediato quando componentes de algum grupo musical se
posicionavam em frente ou ao lado do palco, discretamente, para nos
observar. Pelo interesse demonstrado, atitudes e gestos, sabíamos que
eram colegas que estavam ali para aprender mais um pouco mais ou até
mesmo, quem sabe, para “tesourar” o Big Brasa por qualquer falha
cometida durante a função. Na verdade, dificilmente um grupo se
preocupava tanto assim com a harmonia correta das músicas como o Big
Brasa. Acho que pelas dificuldades encontradas, pelo trabalho difícil e
cansativo de escutar uma música várias vezes até perceber um ou outro
detalhe, o Edson considerava suas descobertas como um “segredo de
Estado”, portanto merecedor de toda a proteção necessária. Muito justo!
Em
algumas dessas oportunidades presenciei o Edson verdadeiramente cercado
por músicos, que no salão ou ao lado do palco, nem piscavam para não
perder um acorde ou outro mais difícil de ser feito. Mas por esperteza,
na hora exata em que ia inserir o tal acorde, ele virava um pouco o
corpo de lado de maneira a esconder dos espiões os acordes desejados,
preservando assim seu trabalho. Podiam copiar tudo, menos o “pulo do
gato”...
João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)
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