Presente de grego
Os
shows que fizemos em Teresina, com o Ednardo, foram excelentes. A
platéia gostou muito, o grupo estava bem ensaiado e tudo correu bem.
Desta vez eu tinha seguido para Teresina de ônibus, sexta-feira à noite,
para que chegasse a tempo, pois os shows seriam realizados no sábado e
no domingo, no teatro. Naquele tempo eu trabalhava na TV Educativa a
semana inteira.
O
teatro estava com um palco bem montado, o Big Brasa com seu
instrumental distribuído de forma excelente, boa produção, jogo de luzes
com marcações perfeitas, boa qualidade de som, tudo muito legal.
Durante
as apresentações, um cara, vestido com trajes indianos, com uma túnica
esquisita, ficava circulando entre os corredores, pela frente do palco,
sempre com varetinhas de incenso, que perfumavam o ambiente e até
ajudavam a criar uma atmosfera mística para o show.
Nos
dois shows esta “figura” esteve presente, deleitando-se com as músicas,
com as luzes e todos seus efeitos, enquanto curtia e espalhava o
incenso pelo público. Fim dos espetáculos, volta para hotel e aquelas
coisas de rotina.
Na
segunda-feira pela manhã, quando eu estava na estação rodoviária,
esperando o ônibus para Fortaleza, de repente me deparei com o tal cara,
que me cumprimentou pelos improvisos de viola e de guitarra feitos na
noite anterior. Gentileza dele. No final daquele rápido contato, aquela
figura estranha disse que tinha um presente para mim. E entregou-me um
pacote, um pouco menor que uma caixa de sapatos, dizendo que aquilo era
para que eu “viajasse” com a música pelo espaço sideral, em um mundo de
sonhos, luzes e cores e uma porção de coisas mais que ele falou. Eu
“saquei” logo aquele lance. Um punhado de maconha. Imediatamente devolvi
o pacote para ele, e agradeci pelo presente, mas disse que não queria
recebê-lo. Como ele insistiu, eu tive que ser mais ríspido, até meio
grosseiro, dizendo a ele que, por favor, se afastasse de mim. Na
verdade, foi o que costumamos chamar de “presente de grego”!
As
drogas estavam por toda a parte. Eu não tinha a consciência disso, a
princípio. Algumas vezes, durante os intervalos dos bailes, cheguei a
receber gratuitamente caixas ou vidrinhos cheios de “bolinhas”, as
anfetaminas, substância que era usada como estimulante. Ao mostrar para
meu pai, ele ficava indignado e comentava:
-
“É um verdadeiro absurdo. Um indivíduo desses não é capaz de oferecer
um lanche, um copo de leite ou uma refeição para um músico. No entanto,
com a maior facilidade, de graça, oferece aquilo que não presta, como
bebidas e drogas”.
Pura
verdade, mas graças a Deus conseguimos trilhar nosso caminho, no mundo
da música, quase sempre perto desse perigo, mas conseguindo evitá-lo.
Esperamos,
com toda a ansiedade, para assistir o jornal da Verdes Mares do dia
seguinte. E valeu a pena. O repórter, após ter noticiado o festival, em
matéria bem produzida, apresentou um longo trecho do filme em que o Big
Brasa aparecia. Todo mundo lá em casa vibrou junto comigo. Na rua e nos
clubes, nas semanas seguintes, a repercussão foi extraordinária. Meses
depois, tentei conseguir esse filme, na TV Verdes Mares, mas não obtive
sucesso. Fiz o possível com o setor de filmagens para localizar aquele
pequeno filme, mas o pessoal alegava não mais encontrá-lo. Hoje, essas
imagens teriam para mim um valor inestimável.
João Ribeiro da Silva Neto
Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe sua mensagem no Blog e participe desta época inesquecível dos Anos 60 e Jovem Guarda!